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Meu nome é Thiago Caro e em Novembro de 2008 decretei uma moratória a mim mesmo.
Morei um tempo bom em Michigan e viajei boa parte dos EUA em treinamento para o trabalho voluntário relacionado a educação que agora faço em Moçambique. Em Fevereiro de 2010 irei de Moçambique a Israel em uma viajem cruzando por terra, em transporte local, Tanzania, Kenya, Ethiopia, Sudão e Egito. Escrevo este blog como maneira de compartilhar minhas experiências e bobagens com todo aquele que ache interessante e fale português.

thiago_caro@hotmail.com

Wednesday, September 30, 2009

Moçambique

Moçambique nossa terra gloriosa, pedra a pedra construindo um novo dia, milhões de braços uma só força. Ó pátria amada vamos vencer.

Conversando, todos dizem que esta região de Moçambique onde estou é uma das melhores do país. As montanhas que se erguem de maneira majestosa em meio a savana, propiciam uma brisa que afasta um pouco o calor africano que está quase sempre a suar e queimar a pele, além do que oferecem um grande entretenimento de domingo para aqueles que gostam de andar pelas comunidades conhecendo a região e terminar a caminhada subindo uma montanha. Além das condições climáticas e geográficas favoráveis, o povo da província de Manica é muito acolhedor e amigo, fora o estranhamento muzungo que por vezes incomoda ambas as partes, me sinto sempre seguro e confortável com o povo daqui.

Quando estive em Maputo por alguns dias (Maputo fica próximo a África do Sul) não me senti tão confortável assim. A cidade é daquele tipo que fica grande sem saber o porque, muita gente vivendo em um espaço que não provê estrutura ou condições de morar, comer ou se locomover. Não pude ir a muitos lugares, já que o transporte é um martírio, lembro de um dia que saí para conhecer o centro mesmo da cidade, e fiquei lá andando, entrando em mesquitas, lojas e etc... quando vi o sol já estava em seus ultimos momentos de raiar. Comecei aí a procurar por um chapa que me levasse de volta para o bairro onde fica a casa dos DIs, mas este era o chapa que menos passava... e quando passava estava em situações que não havia como pensar em entrar ali. Esperei 1, 2, 3 horas até que passasse um chapa em que eu pudesse entrar com um mínimo de dignidade, mas bem mínimo. Como já disse os chapas são um tipo de lotação, mas muito pior, e os de Maputo em especial, tem um Q de crueldade já que as pessoas vão sentadas, depois pilhadas em cima das sentadas e depois para fora, apoiadas em cima das que estão pilhadas. Enfim, depois de esperar por 3 horas fui na categoria pilhados, e estava me equilibrando, deixando os joelhos duros e me segurando no assento do motorista com uma mão e apoiando no teto (que estava a 2cm da cabeça) com a outra, me esforçando para não sentar, literalmente no colo de um rapaz que estava na posição dos sentados... após observar a situação pela qual eu passava, num esforço hercúleo para não sentar em seu colo, o rapaz disse... tudo bem amigo, pode sentar... mas eu me mantive forte até chegar a meu destino. Resumindo, Maputo não é uma cidade muito amigável.

Em um feriado viajei a Beira, praia que fica ao oriente de Chimoio coisa de 5 horas, lugar lindo... as praias do oceano índico, muito salgadas e nem tão cristalinas, mas não por sujeira e sim pela areia pesada. Lá em Beira existem dois navios (que já enviei as fotos) que encalharam na areia e por lá ficaram, enferrujando e abrigando crustáceos... estes barcos juntos ao farol davam um tom meio surrealista a praia do Estoril (eee Portugal) aonde há uma vila de pescadores que trazem grandes camarões (parecem lagostinhas) e vendem o kilo por Mtn 150,00 (USD 5), além de peixes grandes, saborosos e baratos. Em Beira as pessoas são um pouco mais malandras, praieiras ou algo assim... durante a noite muita gente se aproximava dos muzungos no bar... e ofereciam uma putaria ali... um taxi aqui... sempre deixando aquele sentimento de golpe no ar.

Estas três cidades que mencionei formam um triangulo, onde Maputo está embaixo, Chimoio a esquerda e Beira a direita... daqui para cima... the Bush baby... mata, selva e animais... ainda terei a oportunidade de ir a alguns lugares ao norte, creio que eles serão ainda mais longes daquilo que em terras ocidentais chamamos civilização. Que bom.

Moçambique é um país uniformemente pobre... extremamente pobre... quando digo pobreza me refiro a falta de água, alimento, esgoto, estradas, transportes, comunicação (exceto celular)... um vasto portifolio de doenças, pestes, epidemias.... mal nutrição... o povo daqui sofre e muito, isso não é localizado é em todo o lugar.

Esta situação de pobreza é a consequência de muita coisa que deu e daria muitos livros, porém tem um cheiro no ar que me lembra muito um problema bem brasileiro... a merda do ‘jeitinho’ que pode ser chamado de corrupção... acomodação ou coisa parecida, então esse mesmo, mas assim como a maioria das coisas aqui exagerado... Talvez o passado em comum sobre assuntos como Portugal, escravidão, colonia etc, crie esta vontade de ser muito esperto que acaba por deixar que os mais espertos nos enganem.

Aqui na ADPP eu me deparo as vezes com situações que não acredito... a situação acontece, eu olho, reflito e não acredito. A falta de vontade sobre as coisas é impressionante e me assustou muito nas primeiras semanas, a grande maioria simplesmente don´t give a shit. Alguns professores e funcionários daqui veem os DIs como uma grande oportunidade de fazer um pouco menos e tentam jogar seu trabalho em cima de nós, se você aceitar, passa aqui um tempo fazendo o trabalho deles... No caso de você precisar da ajuda de alguém em algo que demande mais que 2 minutos de atenção ... ishhh yowê, vai ser difícil. Essa parte lenta da coisa as vezes me deixa perplexo, mas as vezes me faz pensar, será que eu que estou errado? Oras, eles estão aqui, vivendo muito mal, na minha opinião... mas essa é a minha opinião... eles não conhecem o que eu conheço como civilização então para eles aquilo é algo que passa na novela brasileira a noite. Talvez me preocupo demais, mas confesso que continuo com a mesma opinião.

Andar pelas ruas de poeira de Moçambique (asfaltadas geralmente só as principais dos centros e as 6 rodovias do país) é um flerte com a fama, isso para um muzungo. Praticamente todas as crianças (que são muitas) que encontro, ou acenam, ou vem e pegam na mão ou fazem uma brincadeira ou coisa assim, na verdade o mesmo acontece com os adultos. Esse negócio de pegar na mão me intriga um pouco, já que a sociedade aqui é extremamente machista... um homem pode ter várias mulheres, a mulher é considerada pelos homens um tipo de nada, não existem gays ou eles se escondem muito bem... mas nas ruas é muito comum ver homens de mãos dadas e vira e mexe um quer andar de mãos dadas comigo... é uma cena estranha, mas bem comum que já me habituei a ver... as crianças sempre andam de mãos dadas, brigam muito mas estão sempre de mãos dadas, são pessoas muito carinhosas na verdade.

A população é muito jovem por dois motivos principais (sempre eles), as pessoas se reproduzem demais, muito cedo e também morrem muito cedo. Não é fácil ver pessoas realmente velhas, e quando você pensa que elas são velhas, na realidade são marcas de uma vida difícil. A má nutrição e a AIDS são as principais causas (1 em cada 5 moçambicanos tem AIDS) e isso reflete em uma sociedade com muitas crianças órfãs, que são criadas por outros parentes ou ficam pela rua ou em orfanatos. É muito difícil crescer em recursos quando as bases são essas, as crianças muitas vezes não tem quem as eduque, o déficit de professores é enorme e aqueles que se propõe ao ofício infelizmente não tem uma formação adequada. O fato é que vejo aqui algumas iniciativas internacionais que tentam alguma coisa, ou fingem... um governo que paga em dívida mais do que em saúde e educação juntos e condições de crescimento muito difíceis, mas nada é tão fácil assim.

Moçambique tinha reinos poderosos na época das primeiras explorações portuguesas... o império de Gaza ao sul e o Monomotapa na região central onde estou eram prósperos, porém assim como toda a África, por condições internas, foi sujeito ao tráfico de pessoas e posteriormente a pilhagem européia. Durante os anos de ocupação portuguesa nos séculos passado e retrasado, dizem que muita coisa foi construída aqui e realmente a quantidade de ruinas é muito grande, acontece que segundo a historia (por que segundo ao Coutinho, que é português, Portugal só trouxe prosperidade) após a saída portuguesa forçada de suas possessões africanas, os mesmos destruíram tudo o que tinham construido com as riquezas do país e deixaram como herança uma guerra de desestabilização que foi uma das mais sangrentas do pós neo-colonialismo na África... as facções que depois se tranformariam em Renamo e Frelimo, os dois partidos majoritários, guerrearam pelo domínio do país ao ponto em que tudo o que existia foi destruído. A guerra acabou em 1994 e portanto Moçambique é um país em reconstrução.

Em Outubro acontecerá a eleição para presidente no país, o mandato é de 5 anos e o sr. Emílio Guebuza, atual presidente e partidário da Frelimo será reeleito pela grande maioria dos votos. Nas ruas se encontra a cada 10m alguem fazendo campanha para a Frelimo, mas nunca vi ninguem fazendo campanha para a Renamo. A Renamo é o partido dos portugueses que desestabilizaram enquanto a Frelimo é o partido dos Moçambicanos que lutaram pela independencia (contando a história política com se fossem quadrinhos) portanto a eleição é um tipo de validador para esta nova ‘democracia’ da República Popular de Moçambique (ufanista) que elegerá a Frelimo em Outubro.

Estando longe do Brasil, hoje em dia tenho outra idéia de Brasil. Aquele lugar que talvez seja o mais perfeito com todos os seus defeitos, é realmente um país abençoado, onde apesar de encontrarmos muita desigualdade e guerras internas temos em geral uma vida muito boa, cheia de oportunidades e possibilidades. Os jornais que tenho lido (não brasileiros) colocam o Brasil como um dos países mais independentes da política mundial para sua prosperidade (NYT) ou como uma potência política consolidada no ocidente, junto aos EUA (Times) e isso foi mostrado essas semanas com o caso do presidente hondurenho. Nos tempos recentes o Brasil passou a ter também outra importância política no contexto mundial e acredito que isso pode ser muito bom para nosso povo criar aquilo que ainda falta um pouco, que é a identidade brasileira, de um povo forte, cheio de defeitos, mas que convive em paz, trabalhando e buscando ,por mais que as vezes não pareça, uma situação melhor. Nos Estados Unidos comecei a perceber que eu como brasileiro, não dava o devido valor ao meu país... os made in EUA admiram nosso país e aquele negócio de que vivemos na selva na verdade vem de gente ignorante, aqueles que possuem mais conhecimento sempre diziam alguma coisa de bom sobre o Brasil, nunca ouvi nada ruim, se eu fosse made in EUA isso seria diferente.

Aqui em Moçambique, nós somos o primo rico. A cultura brasileira tem sido muito difundida por aqui, por meios torpes como a televisão, mas por meios mais dignos como boa música, profissionais (médicos, professores, engenheiros), escritores e empresas. Grande parte da pequena estrutura que vem sido criada é feita por empresas brasileiras como a Odebrecht ou Andrade Gutierrez, os aviões das empresas moçambicanas são Embraer. Como nem tudo são flores também tem muitas igreja universal do reino de Deus. Enfim, o que queria dizer sobre o Brasil em meio ao post Moçambique, é que essa simpatia e admiração (acredite) que o mundo todo tem por nós, nos abre portas que muitas vezes não sabemos que estão ali. Se você ai no Brasil trabalhar durante algum tempo com um salário médio vem para Moçambique e vira empresário... aqui tem muito o que crescer e isso vale para outras esferas também, os brasileiros são muito bem vindos na reconstrução deste país e não por filantropia mas por simbiose já que nós que estamos economicamente e socialmente também mais ‘avançados’ podemos contribuir para o avanço de tantas nações que necessitam de ajuda externa, tendo talvez o papel que um dia já foi dos EUA, mas desempenhando este papel de forma diferente, mais brasileira (ah que medo!!!). Uma coisa seria muito boa para todo brasileiro... se desvenciliar da imprensa de massa de nosso país que fatura em cima da ignorância e faz questão de mostrar um Brasil pior do que ele é... leia um pouco da imprensa internacional (nem todos os dias) e veja o que dizem do Brasil...

E viva Moçambique!

Aquele abraço

Wednesday, September 16, 2009

Um pouco de trabalho, lagartos e crocodilos

Ola,

Um post rapido...

Primeiro digo que consegui carregar algumas fotos e criar um albúm novo... O albúm eh chamado Moçambique, mas graças a lentidao da net por aqui não reconfigurei o blog e portanto para ver as fotos de Moçambique, clique na bandeira dos EUA! São poucas fotos e tenho centenas que ainda não adicionei, mas vou mandando pouco, pouco, como se diz.

Agora estou podendo fazer um pouco mais, na verdade nas primeiras semanas ainda por conta da malaria estive me sentindo um tanto quanto inútil, gastando meus recursos e precioso tempo. Não digo que é ruim estar aqui, pelo contrário, conhecer este mundo que para mim fazia parte apenas de livros... mas depois de tanta coisa nos EUA para vir para cá, quero fazer alguma coisa que valha a pena e essa história de muzungo que vem para a Africa ‘fazer a diferença’ já me deu nas bolas. A maioria de nós vem para cá e por uma razão ou outra fica num Safari de 6 meses com pequenas intervenções . Na verdade não é fácil, de boas intenções o mundo está cheio como diria um velho deitado, mas a realidade aqui ao mesmo tempo que abre muitas oportunidades para bons olhos, fecha muitas para nem tão bons, já que as pessoas mesmo não querem mudar muita coisa, como disse, trazer rede de supermercado, lanchonete e outras coisas que estamos acostumados para cá seria um crime, mas água encanada, estrada e energia elétrica não seria suficiente para tirar a identidade do lugar e faria as pessoas poderem pensar em outras coisas. Se perde horas buscando agua ou indo para a cidade.

Como todas as oficinas pedagógicas possuem computadores e dinheiro, já que a Kellogs patrocina, estou fazendo um programa que gerencie as entradas e saídas das oficinas, pois acreditem ou não, NADA é contabilizado, muitas vezes se pede dinheiro para tal coisa e ninguém nem anota em lugar nenhum... ora... quando as coisas funcionam assim das duas uma, ou ninguém se importa com o dinheiro (difícil) ou tem gente ganhando com isso (muito mais real). Essa semana descobri que a segunda opção é uma certeza, só não sei como se presta contas a Kellogs... ok posso imaginar.

Nas primeiras conversas sobre a implantação do sistema nas 10 oficinas da província de Manica, que farei em Novembro provavelmente, percebi que não será fácil fazer com que a ferramenta seja mesmo utilizada, o fato de não haver contabilidade me dá a certeza que o dinheiro não é utilizado para aquilo que é ganho, nem a verba da Kellogs ou de NENHUM dos projetos de geracao de renda, como as machambas, ou serviços de informática, ou pasmem! cursos... já imaginou algum lugar que dá cursos, o dinheiro entra e ninguém sabe o que é feito... ou para onde foi... ou pior, o quanto foi.... pois é, assim mesmo. Conversando sobre cade o dinheiro? as respostas mais ultrajantes para a inteligência alheia foram dadas... só faltou ouvir: Não é da sua conta. Mas infelizmente é da minha conta e quero incomodar com isso.

Ainda sobre as oficinas pedagógicas, temos 35 computadores, dos quais 34 estão parados! Computadores novos... configuração boa... parados. Coloquei 10 para funcionar hoje na oficina daqui e os outros ainda ninguém conseguiu me dizer satisfatoriamente para onde vão. É assim que as coisas funcionam aqui, hoje também arrumei um depósito que a oficina tem, cheio de produtos de informática, esportes, aulas... advinha! Nada de inventário, as coisas entram, as coisas saem, ninguém sabe de nada.

Sei que o padrão moçambicano não permite muita organização, mas vá a merda isso já é estupidez, ou muita esperteza.

Falando de coisas muito melhores... as crianças... como é gostoso dar aula para elas... e para mim não tem sido muito difícil, já que não sei bem porque, se pelo fato que sou diferente fisicamente, ou pela minha maneira de explicar as coisas ser totalmente diferente dos professores daqui, por falar coisas que elas nunca tinham ouvido antes, ou por tudo isso junto, elas prestam uma atenção na aula, que tenho certeza que não conseguiria ter no Brasil. Enquanto falo e enceno, elas ouvem, perguntam, fazem cara de descobrimento... vem depois da aula e me perguntam... é verdade que existem esses vulcões... ou me explica de novo como é que se formaram aquelas montanhas... ou qualquer coisa... acaba as aulas, algumas como o Adão ou o Capitão vem comigo até quase minha casa, perguntando sobre um monte de coisas, muitas das quais não há resposta para, inclusive. O nível é muito baixo, na minha sala de 7 classe tem criancas com 12 anos até 18... algumas com muita dificuldade de aprendizado, algumas que se destacam demais, se interessam demais, querem saber muito. Infelizmente não tem muita oportunidade. O professor Cláudio agora fica bem quietinho nas aulas que assiste e percebi na ultima que ele anotava as coisas que eu falava, acho que foi um avanço.

Ah sim, sobre os lagartos e crocodilos, no fim de semana fomos a um parque de crocodilos em Messica, uma cidade próxima... muitos crocodilos pré históricos, num lugar que lembrava muito o cerrado... não me arrisquei a mergulhar no rio. hehe. Domingo uma andança para a montanha mais próxima daqui... na verdade eu e o Rodrigo iamos a cabeça do velho onde se vê o Zimbabwe, mas no meio do caminho encontramos o Abdul (um menino da escola) que disse nos guiaria para lá, já que é uma caminhada na mata de 2horas e meia... vamos lá Abdul... mas ele se confundiu e nos levou para outra montanha (acredite!), tudo bem, a vista era boa e no caminho muitos lagartos... pequenos, mínimos, médios, dinossauros... brancos, pretos, coloridos... isso ai.

Até que não foi tão curto

Aquele abraço

Wednesday, September 9, 2009

Algo bom a fazer

Ola,

Depois de alguns dias com bastante preguiça de computador cá estamos de novo, em uma noite de lua laranja ouvindo um bom chorinho.

Em um dia da semana passada que não me recordo qual, Bobby me liga a noite, quando já estava a dormir (jeito moçambicano) e me pede para ajudar a preparar uns computadores para a feira de tecnologia de Chimoio... quando ouvi a informação ela me soou estranha, mas estava meio dormido, então acordei as 6:00 como combinado graças a meu telefone despertador. Pela manhã já acordado a notícia me soou um pouco mais estranha ainda... feira de tecnlogia em Chimoio? Converso com o Bobby que me informa um pouco mais sobre a tal feira e me mostra a proeza que deseja eu execute... instalar o sistema que funciona em um computador cliente, com servidor lá nas terras frias dinamarquesas em um computador normal. Esse é o sistema que os alunos da EPF utilizam para dirigirem seus estudos e as matérias pelas quais se interessam, o nome é DMM e na verdade ele é bom mesmo... as pessoas que o utilizam tem acesso a uma base de dados gorda, sobre praticamente tudo que se imagine e podem escolher um tema que vai de lições bem básicas a exercícios mais avançados... a maioria das não muitas vezes que o utilizei nos EUA buscava lições de agricultura, matéria pela qual comecei a me interessar lá, mas ainda sou uma grande anta.

A instalação do sistema e da biblioteca digital (com uns 1000 livros) demorou um dia para ser feita, configurada e tudo mais... uma grande canseira mas terminada no dia, já que a feira seria no seguinte.

No seguinte a grande feira... chegamos as 7:00 a.m por que era o horário marcado e Bobby não gosta do horário moçambicano. Porém os moçambicanos ... aaahhh como eles gostam. As 7:00 logicamente não havia ninguém montando nada ainda e demorei uns 15 minutos, para com ajuda de um senhor que agora me foge o nome, montar nosso grande stand, armado em cima de uma mesa capenga coberta com uma capulana, o local, o clube muçulmano de Chimoio. Se o caro leitor acompanhou a linha do tempo, as 7:15 já não tinha mais o que fazer e o fato de que a feira começaria as 2:00, que acabara de descobrir, começava a me preocupar mesmo por que esqueci de pegar o livro que estava lendo e meu celular só tem o jogo da cobrinha que vai comendo bolinhas de não sei o que no caminho... passa uma manhã infinita e pelas 2:00 as pessoas entram na feira finalmente, porém havia sido dito que a governadora da província de Manica estaria lá para ‘cortar a faixa’ porém... a governadora é moçambicana.

Os ‘stands’ tinham variadíssimos temas e descobri que não se tratava de uma feira de tecnologia mas sim uma feira de qualquer coisa que tivesse a ver com desenvolvimento... então estavam lá 2 faculdades, outras ONGs, senhoras que tinham raízes para qualquer problema, armadilhas ninjas para caçar cobras e etc... Foi uma tarde agradável, fiquei com 2 estudantes explicando para quem interessasse sobre o que é o DMM, biblioteca digital e o trabalho da EPF... a governadora (fato que me surpreendeu, já que mulher aqui não é muito respeitada) que é bem moçambicana chegou as 5:30 para cortar a faixa e quando terminou de passar em todos os expositores a feira acabou... naquele dia, já que nos 2 seguintes continuaria, porém não para mim visto que tinha terminado meu trabalho, tudo funcionava e os estudantes são aptos a explicar sobre sua ferramenta de estudo de maneira satisfatória.

Nos dias que já eram fim de semana, motivados pelo fato que segunda, 7 de Setembro (ahhh Brasil!!!) também é feriado aqui (dia dos acordos de Lusaka que foram parte do processo de independência de Moçambique, Zâmbia e Zimbabwe) todos nós DIs fomos a uma casa de outro projeto da Humana que fica em Beira... uma praia muito gostosa, no melhor estilo bahiano, porém no oceano Índico e com o atrativo de possuir em suas areias os restos de 2 navios, um bem grande, abandonados lá desde tempos que não sei quais. Os navios a frente do farol davam um tom meio surrealistico para a praia e a água de cor mais escura e bem salgada, porém limpa, era bem diferente da suja que tinha perto da casa dos DIs... para a praia chapa é claro. Outra coisa curiosa sobre aquela praia era a água brotando da areia, no limite de onde a maré cheia chegava... me lembro de ter visto isso uma outra vez no Rio Grande do Norte e na verdade não sei o porque aquilo acontece, sei que em lugares onde haviam pedras maiores, a água chegava a jorrar. Peixinho na brasa, sol de rachar o coco e um primeiro contato com o índico que ainda pretendo conhecer mais, o soldo que a Humana paga não é nada quando convertido ao USD por exemplo, mas por aqui é mais do que suficiente, ainda mais por que sempre se consegue carona e para voltar viemos na boléia de uma pick up que tinha até cobertura. Carona de luxo!

Ontem pela manhã a primeira aula com as crianças na escola infantil da EPF, Formigas do Futuro... para elas, ciências sociais do professor Muzungo (brincadeira). Estava meio nervoso com certeza mas passou depois de um animado “bom dia querido professor!” e fiquei lá com elas na próxima hora explicando sobre o continente americano, os oceanos que banham... um pouco sobre o descobrimento do continente e como a América influi na história da Africa pelo colonialismo, porém de maneira um tanto quanto básica, por que percebi o que já tinha percebido, o nível não é de uma 7 classe como no Brasil. Não que o ensino no Brasil seja muito bom, não.... mas pelo menos tem um sistema de ensino que ainda que capenga é melhor do que a completa bagunça. Deixando de lado sistema de ensino e limitações acho que foi uma boa primeira aula, as crianças ficaram bem quietinhas enquanto eu falava, e bem faladeiras na hora que era para elas falarem. Acredito que a idéia seja que para cada conteúdo que o livro indica como o curriculo deles, deve-se partir do ponto 0e tentar ao máximo ser simples na explicação sem ser autoafirmativo (como os professores daqui) ou tratando a criança agindo como uma. Nunca fui educador e para mim isto não é e não será fácil, porém assistindo outras aulas lá na escolinha e pelas intervenções do professor que acompanhava minha aula, percebi que posso trazer algum benefício... os professores que me desculpem, mas lhes falta muito conteúdo, muita humildade já que falam asneiras inimagináveis como se fosse uma verdade universal, e muita didática já que algumas vezes por aqui penso na escola que meu pai sempre me contou frequentava quando criança... Uma cabana, com um professor gritalhão que não controla os ânimos pelo que está explicando, mas sim por berros ou objetos atirados (!). Hoje não sei, mas senti uma perplexidade por parte do professor que acompanhava minha aula, as crianças pareciam interessadas, me arrisco a dizer que realmente estavam... ficavam quietinhas e tentavam responder as perguntas que deixava no ar... por vezes ele fazia intromissões com gritos sem sentido, repetindo uma decoreba que poxa vida... num funciona né... algumas vezes cheguei a pensar que ele queria tumultuar o que tava harmônico. Foi uma boa experiência e toda segunda, terça e sexta estaremos juntos, como se diz por aqui...

É isso aí, a lua já se moveu bastante e a preguiça de computador ataca novamente.

Aquele abraço