Obrigado pela visita!

Meu nome é Thiago Caro e em Novembro de 2008 decretei uma moratória a mim mesmo.
Morei um tempo bom em Michigan e viajei boa parte dos EUA em treinamento para o trabalho voluntário relacionado a educação que agora faço em Moçambique. Em Fevereiro de 2010 irei de Moçambique a Israel em uma viajem cruzando por terra, em transporte local, Tanzania, Kenya, Ethiopia, Sudão e Egito. Escrevo este blog como maneira de compartilhar minhas experiências e bobagens com todo aquele que ache interessante e fale português.

thiago_caro@hotmail.com

Thursday, December 24, 2009

Feliz Natal

Ola,

Ano passado estava neste dia em Washington D.C.... Neve, pessoas na rua cantando trá-la-la-la-la ... sim era Natal.
Aqui não parece o Natal que conheço, nada daquilo. Mas o significado é o mesmo.

Feliz Natal para todos os que passarem por aqui, lembre que independente de crença ou o que seja, neste dia nasceu um homem que através do amor revolucionou o mundo. O que fizeram em nome dele depois é outro assunto.

Grande abraço

Wednesday, December 16, 2009

A vitória vem do sofrimento... O homem luta e vence

Olá,

Há três dias estava tentando escrever alguma coisa sobre uma casa que sempre passo no caminho para minha venda preferida, venda esta onde uma mulher possuidora de um sorriso lindo se contorce embaixo do teto baixo com sua criança amarrada pela capulana nas costas e mais algumas crianças no chão comendo um pouco de terra.

Nesta casa moram 2 mulheres e algumas crianças, estas duas mulheres são mutiladas por algum motivo que não sei o qual, uma delas não possui uma perna e um braço a outra não possui os dois braços. Apesar desta clara limitação física, as mulheres vivem sozinhas com as crianças (digo, não há homens) e todos os dias, por volta das 6 da manhã estão lá, caminhando com a enxada na mão que ajuda a equilibrar a falta de uma perna ou com uma pilha de lenha na cabeça equilibrada não sei como, já que o fato de equilibrarem tudo na cabeça me deixa de boca aberta, porém sem os dois braços... como pode ser possível tal equilíbrio ? Como muitas coisas em Moçambique, não há explicação.

As mulheres moçambicanas são admiráveis, levam as crianças e a sociedade nas costas. Já os homens...

Enquanto escrevia isso Adão (garoto que sempre está próximo) veio a minha porta com vergonha de alguma coisa que tinha a me dizer, conheço ele sabia que tinha algum problema... depois de certa insistência ele me mostra o seu pé e me assusto com o que vejo. Há um tipo de verme muito comum na verdade por aqui chamado Mataquenha, assim como o bicho geográfico ele entra pelo pé e vai crescendo dentro da pessoa. Acontece que no pé de Adão havia como 40 mataquenhas, era possível ver os bichos através de sua pele negra... A carne de seu pé estava apodrecendo por causa da quantidade de buracos. Fiquei nervoso com ele, por que me mostrou isso só agora quando já não tem mais pontas nos dedos? Me disse que estava com muita vergonha e não tirava o sapato para nada, oque ajudava o bicho a se reproduzir.

Era noite e fui a cidade para tentar algum medicamento para o pé... 5 fármacias, 2 clínicas e o medicamento estava em falta na cidade, nem permanganato de potássio existia. Quando voltava decepcionado para casa entrei na ultima opção, a clínica cara onde os brancos vão sempre que tem algum problema... ela é realmente cara. Converso por um tempo com uma enfermeira e explico o ocorrido, ela me explica que se há tanta mataquenha necessita uma microcirurgia que infelizmente não posso pagar porém ela entende a situação e me diz que venha com Adão no dia seguinte pela manhã pois ela nos levaria a um hospital onde conhece o médico que atenderia ele de graça.

Na manhã seguinte vamos ao hospital e Adão é atendido... um remédio para desinfectar o pé, alguns antininflamatórios e antibióticos e a informação de que a microcirurgia terá que ser feita em casa, com uma agulha de costura. Voltamos para casa e com a agulha que tenho começamos a tal 'microcirurgia'... tiro algo como 10 mataquenhas de seu pé e então não aguento mais, ele tira as outras sozinho. Após terminado o feito mais uma boa parte do pé se foi e o pior para ele estava por vir já que teve que por uma hora aguentar seu pé mergulhado no remédio para desinfecção... chorava demais, me apertava forte...

Durante dois dias mais teve que mergulhar o seu pé desfigurado naquela coisa que ardia os olhos ao se aproximar... chorava demais, porém funcionou. Alguns bichos que haviam sobrado ele foi tirando com a agulha e agora seu pé está limpo pelo menos e é possível ver que está se recuperando, creio que da próxima vez ele mostrará seu pé quando o primeiro bicho entrar.

E se você ver o sorriso lindo dele não acredita.

Estou escrevendo pouco por duas razões, a primeira que por causa das chuvas estamos muito tempo sem energia elétrica, a segunda por que tá difícil escrever qualquer coisa mesmo.

Grande abraço

Tuesday, December 8, 2009

Malaria 2 - O retorno

Ola,

Começou a estação chuvosa no sul do continente africano, dura até Fevereiro e depois sem chuva durante todo o ano... entretanto do final de Novembro até Fevereiro chove muito, muito forte e a estrutura precária fica um pouco mais precária.

As estradas estão destruídas e com a chuva muitas ficam simplesmente impassáveis mesmo em 4x4, a eletricidade que já extremamente oscilante é interrompida pelos primeiros pingos do dia, as vezes demora pares de dias para voltar... sem eletricidade, sem água para nada, já que a mesma é trazida de lençóis subterrâneos por bombas que por sua vez necessitam eletricidade para funcionar... água somente de um poço que possui uma bomba manual...

Outra diferença da estação chuvosa é a mudança nos pequenos animais como os insetos, eles agora estão em número cada vez maior e na porta de casa há um tapete longo, com asas de um tipo de libélula formiga que está em todo o canto... os sapos fazem a festa enquanto esses insetos estão no processo de perder suas asas (lagarta - voador - lagarta novamente) e ficam engordando seu bucho esticando a língua de maneira aleatória visto que não importa o quão ruim seja de mira, algum destes insetos o sapo vai pegar... e são pretos, amarelos, laranjas rajados em preto... grandes, pequenos, olhos esbugalhados, patas largas.

Junto a sapos, libélulas, cobras e aranhas vem o famoso... presente... indesejável... Kinder Mosquito com surpresa ! o maledeto está por todos os cantos e por mais repelente, blusa (e olha que tá quente), mosqueteiro que se use, ele te pega. Me pegou de novo.

Sexta feira aquela sensação ruim... corpo cansado e a mutação em um Zumbi humano. Caminhei até a clínica apenas por desencargo de consciência pois já sabia que estava com malária de novo, um teste e certeza... Aquele monte de medicamento, alguns dias de zumbi e pronto, cá estou eu quase recuperado novamente. A malária é uma merda, te atrasa os planos.

Estou numa briga incansável com a Vodacom, empresa da Vodafone que faz a telefonia móvel em Moçambique... um serviço triste, deplorável e caro. O acesso a internet que eu deveria ter levado a algumas semanas para as oficinas pedagógicas está de rosca por que os benditos não conseguem me entregar os modems. Mas Tudobom (este é o slogan da Vodacom)

É isso aí, fiquei sem escrever por que durante mais de uma semana não tivemos energia elétrica e depois o anófeles me levou ao estado Zumbi, porém por aqui apesar dos pesares... Tudobom

Saturday, November 28, 2009

Solidão

Desperto com o som dos pássaros que fazem ninho no telhado de palha em casa,
Preguiça... cansaço...
Um pão e um café... uma conversa jogada fora... uma brincadeira com a criança,
Lembrança do acordar bêbado, corrido, colocar a gravata e a aventura do trânsito paulistano.

Muitas vezes me vejo rodeado... todas as idades, todas as necessidades.
Faço o que posso, me sinto importante e solitário.

Muitos amigos... muitos cumprimentos, pouca cumplicidade. Já não sei quem me quer e quem me suga.

Muitas vezes me sinto amado... sinto o amor de um amigo, de uma mulher... olho mais fundo e sinto falta de acordar embriagado.

O ser humano é mesmo uma criatura imperfeita ao extremo, nunca contente com aquilo que tem... nunca satisfeito. Esse é o combustível que o desperta todos os dias, tanto os embriagados quanto os que acompanham o primeiro vôo de um pássaro no ninho feito no telhado.

A verdade é que não importa se embriagado por beleza ou tristeza, todos os dias desperto e como o nobre de Capadócia mato meu dragão. Tento queimar todo o combustível disponível hoje pois amanhã quem sabe precisarei de um pouco menos.

Thursday, November 26, 2009

Correção

No post sobre o parque de Gorongosa passei uma informação errada... escrevi merda mesmo. Brevemente, o parque foi criado pela primeira vez em 1920 e com diferenças na área delimitada de hoje perdurou até os primeiros anos de guerra (1983) quando teve que ser encerrado.
Com o fim da guerra e a matança da grande maioria dos animais terrestres o parque foi reaberto nos anos 90 e desde então tem sido feito um grande esforço para sua recuperação. Anteriormente havia dito que o parque foi criado nos anos 90.

Agradeço ao sr Vasco Galante, Diretor de Desenvolvimento Turístico do parque, que me enviou um email com esta correção. O site do parque para quem se interessar em saber mais sobre a história ou quem sabe conhece-lo é www.gorongosa.net


Consegui enviar as fotos de Gorongosa, estão no final do post anterior.

Wednesday, November 25, 2009

Gorongosa National Park

Ola,


Moçambique era um país de fauna muito rica... era.

Todo o país a 40 anos atrás era repleto de animais como antílopes, búfalos, elefantes, leões, etc... porém em 40 anos muita coisa mudou por aqui. Com a saída (nada voluntária) dos portugueses e a posterior guerra civil que durou 16 anos, o país ficou destruído e essa destruição se extendeu a todos os que viviam aqui, inclusive os animais.

A fome que criou esta geração de adultos antes crianças subnutridas levou ás consequencias que se pode imaginar... tudo o que se movia era caçado e cozinhado. Os animais que sobraram fugiram para onde a savanah é mais afastada das pessoas. Com o final da guerra no início dos anos 90, foi criado o parque nacional da Gorongosa que é o maior de Moçambique, este parque é apenas uma área grande do país que foi reservada apenas para animais onde pessoas não podem morar ou caçar... não há uma estrutura, apenas terra delimitada na região onde a maioria dos animais buscou refugio contra a fome humana. Uma idéia da matança acontecida pode ser mostrada com números... por exemplo, em 1970 na região do parque viviam mais de 4000 zebras, nos anos de guerra esta população caiu para 0... Sim 0, não haviam mais zebras... todos os búfalos também foram mortos... alguns poucos elefantes, leões e hipópotamos se salvaram.

Com a delimitação da área do parque mais animais foram trazidos de países vizinhos em um esforço de se recuperar parte da fauna antiga, porém ainda hoje a população de alguns animais é muito baixa... as zebras não voltaram, os elefantes se escondem, os leões só se pode avistar a noite. Final de semana passada fomos em 9 DIs (voluntários estrangeiros) para visitar o parque...

Sexta feira went to the town a procurar um carro para alugar e depois de conversar com todos os motoristas que encontrava consegui uma chapa (van daquelas de lotação) para alugar... alugamos e puta merda, que estranho dirigir um carro do lado direito... minha sorte foi que a van não era tãooo velha, e o cambio era automático... no começo uma grande dúvida sobre que lado da estrada era o meu (lado do motorista invertido, mão invertida) mas após alguns minutos já acostumara com essa inversão toda.

Dormimos em Lamego, uma cidade próxima e dia seguinte rumo ao parque. Ao chegar no parque recebemos a notícia de que por causa da chuva não seria possível fazer o safari com nossa van... merda, vamos gastar dinheiro. E tivemos que gastar mesmo, o aluguel do carro do parque, um grande 4x4 não era dos mais baratos, porém não havia como voltar atrás visto que este era o último final de semana do parque este ano por causa da estação chuvosa.

A savanah em Gorongosa é uma das coisas mais lindas que pude ver até hoje... árvores milenares, gigantescas... floresta fechada.... savanah aberta... e aquele cheiro de Africa que se aprende a sentir com o tempo. Infelizmente graças a despopulação do parque é difícil ver elefantes, leões, rinos... porém com certeza os animais que pudemos ver valeram a pena... lindos macacos, javalis, busch bucks, impalas, crocodilos. aves gigantescas, águias, cervos, etc... Os big five (Leão, Elefante, Rino, Girafa e Zebra) deixo para conhecer no Kenya, onde eles estão em meio a população. Deixo algumas fotos abaixo

Um grande abraço

Da esquerda para a direita, Vyttas (Lituania), Angus (Canada), Lydia (Espanha), Victor (Romenia), Orchid (Hungria), Magda (Portugal), Rodrigo (Brasil)

Muzungos e a Lotação alugada, parados em Inchope para reabastecer o estômago
Busch Bucks
Impala


Javali (Pumba para os intimos)


Babuínos em um momento de descontração

Não me pergunte o nome deste rapaz...

Monday, November 16, 2009

Confusão

A dúvida... aquilo que traz coragem e medo.
Sem ela tudo seria muito insípido, monótono, certo... e não existiria coragem.
Com ela e o medo do fracasso é fácil não se encontrar em lugar nenhum.

Quando existem dois caminhos há algum problema de percepção.
Quando se percebem os muitos caminhos, lá está a dúvida... é preciso coragem.
Quando se percebe apenas um caminho, culpe ao medo de enxergar os outros. Afinal culpar é para quem não tem coragem.

Durante a vida procuro um caminho... ele não é reto e mesmo o ‘destino’ vai mudando.
Ao perceber que a dúvida estará sempre presente, abro o peito e tenho coragem.
Muitas vezes tenho medo e quero enxergar um só caminho, que me leve a um destino seguro. Esse caminho não existe, afasto o medo...

De onde tirar coragem hoje ?
Do mesmo lugar de ontem ?
Amanhã talvez tenha que confrontar uma nova dúvida.

Que venha.

Thursday, November 12, 2009

Odete Temóteo

Ola amigos,

Esta carta chegou a mim agora a noite junto a outras de outras crianças que ano que vem não podem mais estudar nas formigas do futuro. Estas crianças precisam de ajuda (financeira) para poderem começar a escola secundária ano que vem e a história de todas elas é muito triste.

Se alguém puder e quiser ajudar entre em contato comigo thiago_caro@hotmail.com

Meu nome é Odete Temóteo, tenho 17 anos de idade e estou na escola formigas do futuro, escola que me ajuda até hoje desde 2004 quando comecei a estudar lá. A minha mãe morreu em 2002 com uma doença que não conheço e meu pai a abandonou quando eu ainda era criança, não sei onde ele está. Quando minha mãe morreu eu tinha 10 anos e não tinha aonde ir porque minha família não queria viver comigo, meu tio e minha tia me levaram para viver junto, mas eles não tinham trabalho porque meu tio é doente.

Antes de minha mãe morrer ela queria que nós morressemos com ela e disse a minha tia que iria matar as duas filhas com veneno. Minha tia não deixou a mãe matar as suas filhas e disse que ficaria conosco, minha mãe chorou por dois dias e depois de uma semana morreu, então ficamos um mês com meu irmão mais velho que depois fugiu e fomos para a casa de uma amiga da minha mãe aonde ficamos por duas semanas, depois a tia veio nos buscar e levou para viver com ela. Desde que minha mãe morreu meus tios e primos nunca compraram uma roupa para mim, por isso venho pedir a escola que me ajude.

O meu sonho, gostaria de ser polícia ou enfermeira

Obrigado a todos os que me ajudaram.

Monday, November 9, 2009

Comentarios

Tinha feito uma configuração tosca no blog e não estava habilitada a página de comentários... Agora funciona

Família

Ola,

Este final de semana estive em Beira (a praia com o cemitério de navios na areia ) porém preocupado com uma situação ocorrida na sexta feira.

Abdullah é um menino um pouco mais crescido, tem 16 anos e trabalha no projeto da padaria ajudando a fazer a massa e depois vendendo o pão na comunidade... ele é um daqueles meninos que está sempre por perto, ajudando em alguma coisa... já terminou a escola primária e está na secundária e tem muita disposiçao... além de ser muito honesto. Resumindo é um menino muito bom.

Abdullah mora sozinho, já que seu pai é do exército e aparece uma vez por mês... o pai não envia um centavo para ele que tem que se virar como pode... sempre almoça e janta conosco e vai levando assim... morando sozinho, numa casinha sem apoio de familia.

A semana passada foi um pouco mais difícil para ele. No começo da semana perdeu o celular de outro amigo que avisou ao pai... o pai deste amigo foi até a casa de Abdul e disse que se até o sábado o mesmo não pagasse o valor do celular, ele iria até a casa e tiraria o que lá houvesse... ou seja, duas panelas, uma esteira e algumas poucas roupas. O celular usado custa 500Mtn e apesar de agora ele estar trabalhando na padaria seria bem difícil que conseguisse comprar um celular, já que infelizmente ele só ganha Mtn 100 por semana (USD 4). Conversei com os outros DIs para darmos um jeito de conseguir o dinheiro para ele, porém antes do prazo na quarta feira, o pai do amigo foi a casa do Abdul... bêbado, e tentou levar as coisas dele. Por sorte Abdul chegou na hora e pediu mais tempo.

No dia em que o homem entrou em sua casa, Abdul chegou em minha casa com uma cara que eu não estava acostumado a ver, ja que apesar de tudo isso o menino sempre tem um sorriso no rosto... este dia ele estava profundamente triste e humilhado, não conseguia olhar para mim e chorava. Dei meu celular para ele.

Dia seguinte, com esta situação já resolvida ele vem a minha casa pela tarde com o mesmo semblante de antes... pergunto o que acontece e ele me explica.

Seu pai voltou para casa, após um mês sem noticias ou colocar um centavo na mesa de Abdul... e ao chegar ficou sabendo que o menino estava chegando em casa tarde por que estava trabalhando... então disse a ele para que tirasse as coisas de casa naquele momento e fosse embora já que agora ele tinha responsabilidade e um trabalho... mandou o menino para fora de casa simplesmente por que ele tentava sobreviver, já que sem trabalho não tinha dinheiro para comida. Combinei então com Abdul que na segunda feira iria falar com seu pai para explicar, que ele estava ajudando na padaria mas não tinha condições de sair de casa. Ele ficou o final de semana na casa de outro amigo nosso.

Veja bem a situação... o pai não dá nada ao Abdul, deixa ele em casa sem comida sem nada e quando volta e descobre que o menino está tentando se virar manda ele embora de casa por que já possui responsabilidades. Após alguns meses aqui posso dizer que a família aqui tem uma outra organização completamente diferente da que estava acostumado... cada um é uma entidade bem definida que tem que lutar pelo seu lado... o pai dá um jeito de conseguir suas coisas, assim como a mãe e posteriormente os filhos que geralmente são muitos... cada um cozinha sua comida o que muitas vezes leva a acidentes como ocorrido com o Adão, outro menino, sua irmã gemea Eva estava cozinhando quando ainda muito criança... se descuidou e uma chama chegou ao teto que era de palha como sempre. O resultado acho que pode ser imaginado, eles perderam tudo inclusive a casa.

Chegando ontem a noite em casa tenho a boa noticia de que uma tia de Abdul havia conversado com o pai e pedido para que o menino voltasse para casa minutos antes... O alivio foi enorme pois após pensar bastante no que poderia dizer para o pai não cheguei a conclusão nenhuma... ia lá conversar com ele porém sem saber muito bem como ou o que. Ontem Abdul estava bem mais tranquilo e sorridente de novo.

A cada dia dou mais valor a vida que tenho e agradeço mais a minha família que com muito esforço pode me proporcionar uma infância extremamente feliz e muitas oportunidades de escolha...

Obrigado a minha família

Um grande abraço

Tuesday, November 3, 2009

O ovo maldito

Um breve comentário.

Muitas vezes penso que não devo fazer uma coisa e ao fazê-la chego a conclusão que antes estava certo...

Não gosto de pedir para os meninos, que sempre estão por perto, para irem fazer as coisas para mim... coisas como ir comprar uns tomates ou ovos por exemplo. Ovos são muito frequentes no cardápio, visto que os mesmos são um dos poucos alimentos vendidos nos mercados locais e andar até a cidade é uma caminhada de 1 hora... um detalhe na compra dos ovos é sempre pegar aqueles que estão longe de onde bate o sol. Pois bem.

Alguns dias atrás estava conversando com outro voluntário brasileiro no 'cyber cafe', quando o Adão (menino da escolinha) apareceu e ele pediu para que fosse buscar ovos... então pedi para que trouxesse alguns para mim também... 10 minutos depois aparece um guarda da EPF.

Sr Thiago, vc pediu para este menino comprar ovos?
Sim, sim...
Ele foi por baixo da cerca e não pode, por isso... aquilo e aquele...
Ok, desculpe, não sabia que ele ia por lá...
Poxa Adão... vai pela porta da frente né.

Dia seguinte, com o ovo já devidamente depositado em meu estômago, acordo com o mesmo realmente estranho e suando frio... Puta merda comi alguma coisa estragada, um arroto e percebo que foi o ovo.

Desde então (3dias) estou tão ou mais podre que aquele ovo... já parei de comer quase de tudo, dieta do líquido... e aquele gosto de ovo não vai embora, assim como o turbilhão que toma conta de meu sistema digestivo.

Viu só, não gosto de ficar pedindo as coisas para os meninos, acho abuso... pedi e ganhei um ovo podre.



Olha o Adão aí!



Monday, November 2, 2009

Eleições em Moçambique

Olá,

Esta semana aconteceram as eleições presidenciais de Moçambique. Aqui desde 1992vigora o sistema multipartidário, porém seguindo o exemplo de muitos outros lugares dois partidos costumam dominar as eleições, aqui são a Frelimo e a Renamo porém suas histórias são bem diferentes de Democratas e Republicanos ou mesmo posso ousar e dizer PSDB e PT.

A Frelimo (Frente de Libertação de Moçambique) surgiu no âmbito da independência de Moçambique... fundada a partir da união de 3 organizações nacionalistas Moçambicanas baseadas na Tanzania, foi a frente que lutou a guerra de independência contra os portugueses em idos dos anos 60 e desde então é o partido que está no poder federativo, com muitas turbulências no caminho. A guerra de independência foi financiada pelo bloco socialista, assim como os primeiros anos de administração, portanto a Frelimo ilustra bem o lado vermelho na briga pela Africa recém independente em meados do último século.

A Renamo surgiu de um movimento contra o caráter socialista da Frelimo e segundo muitos aliada aos portugueses que não fugiram após a guerra... portanto era o movimento financiado pelo bloco capitalista, principalmente Africa do Sul, Rhodesia (Zimbabwe) e E.U.A. Fundada em 1977 a Renamo possui em seu histórico incursões sociais nada louváveis como o recrutamento de milhares de crianças soldados, artilharia aleatória contra vilarejos e todos os tipos conhecidos de tortura... nada muito diferente da maioria das 'estratégias' de guerra.

Ambas Frelimo e Renamo, seguindo os requisitos políticos, não possuem santos em seus quadros.

A luta entre Moçambicanos durou enquanto durou a guerra fria, até 1992 e destruiu o pouco que existia no país... a Guerra Civil Moçambicana foi uma das mais violentas na África independente e deixou uma herança que ainda se nota o cheiro... ruínas, falta de alimento, água, transporte, muitos adultos de hoje crianças mal nutridas de ontem.

Durante estes meses em Moçambique presenciei todo o tipo de campanha por parte da Frelimo... discursos, eventos, carros de som, motos de som, bicicletas de som, todo tipo de propaganda suja rua, músicas, músicas e músicas. Uma peculiaridade, muitos slogans brasileiros de políticos notáveis copiados...

A Frelimo é quem fez, a Frelimo é quem faz.
Foi Maluf quem fez, é Maluf quem faz

ou

Quando a Frelimo promete, Cumpre.
Quando Maluf promete, cumpre.

fiquei sabendo que em Angola é.... Angola, um país de Todos

Agora me pergunta se eu vi alguma propaganda, evento, comício ou qualquer coisa da Renamo... nada. As pessoas que votam na Renamo votam quietinhas, sem contar para ninguém... mas votam, por que em algumas províncias os governadores são Renamo.

De qualquer maneira, os moçambicanos votaram em massa e como apenas os slogans são brasileiros o resultado só deve sair daqui a uma semana... mas todos já sabem, o Sr Armando Emílio Guebuza, Frelimo, será reeleito para mais quatro anos de mandato, por que como ouvi hoje numa conversa entre os professores no café da manhã...
'Melhor é votar na Frelimo, por que eles tão lá roubando a quase quarenta anos... já pensou se tiver que escolher outro para começar a roubar do zero...'

Aquele Abraço




Monday, October 26, 2009

Dombe e Vilankulos

Ola,

Esta semana viajei para Dombe e Vilankulos, o primeiro povoado para trabalhar e o segundo para ir.

Saímos de Chimoio rumo a Dombe na segunda feira pelas 5 da manha, eu, Zeferino que é o gestor da oficina pedagógica de Manica e o sr Magaíssa, motorista da ADPP... No caminho passamos por Sussundenga onde Nero e Alberto, que são gestores de outras oficinas, se juntaram rumo a oficina de Dombe. Uma viajem muito confortável para os padrões já que fomos 5 pessoas num carro feito para 5 pessoas. Dombe fica ao sul de Chimoio ainda na província de Manica, o caminho fora de série... vales, florestas densas e fechadas, muitos macacos e até mesmo elefantes... infelizmente só vi alguns macacos pelo caminho e nenhum elefante cruzou a tortuosa e poeirenta pista enquanto passavamos. Uma parada em meio ao pouco e a proximidade de árvores gigantescas, bananeiras de Itú e os sons dos animais era sentida, lá pegamos bananas deliciosas... continuamos e chegamos ao destino final após 5 horas de muita conversa e este tipo de paisagem.

Já em Dombe junto a alguns gestores que também não conheciam a oficina fiz um tour de 11 segundos, suficiente para conhecer todas as duas dependências e mais tarde instalamos os dois computadores que levavamos, deixei que eles tentassem e conseguiram fazer o trabalho... instalamos também uma pequena rede entre os 4 computadores da oficina, que tendo em base o fato que aqueles são os únicos computadores da vila, foi também a primeira... primeiro futuro posto de guerras Warcraft em Dombe. rs

Nossa acomodação (na unica pensão de Dombe) foi com certeza a mais simples que fiquei até hoje... uma casinha de pau a pique e palha, uma cama, uma cadeira e uma latrina... pela manhã um balde de água fria para o banho e é isso aí... A latrina nada que não se possa viver sem presenciar, o odor é algo que impede qualquer possibilidade de uma mijada após a refeição... ressalto o fato que na oficina o banheiro era latrina, portanto por mais que eu andasse ou corresse para procurar um vaso, provavelmente me acidentaria em minhas necessidades já que esgoto era algo desconhecido em longa distância. Após o dia de trabalho trabalho assistimos a um filme moçambicano sobre Frelimo e Renamo, os dois partidos que são a herança da guerra de 16 anos que destruiu o país, ou melhor, os dois lados da guera... a vila de Dombe ainda hoje possui várias ruínas da guerra que acabou a 15 anos e assistir aquele filme ali, com crianças e os gestores que eram crianças na época, reafirmou a certeza que a guerra foi uma grande contribuição para a pobreza de hoje. As eleições serão na próxima quarta feira.

Nos dois dias seguintes fizemos o plano de geração de rendimento das oficinas já que ano que vem acabará o patrocínio da Kellogs que permite estes encontros, as capacitações, e os pequenos investimentos, portanto eles terão que conseguir tocar as oficinas sem patrocínio o que deve levar a um maior movimento, além de mais disposição para controlar o dinheiro que entra de sai. Nosso plano de instalar 10 fotocopiadoras nas oficinas e com a renda das mesmas pagar o acesso a internet, que hoje não existe, foi também discutido porém após ver melhor a situação em Dombe... sem ter mesmo energia elétrica (apenas gerador), fiquei em dúvidas sobre a viabilidade de ambos, copiadora e internet chegarem a lugares tão remotos, até este momento se pensava que haveria um contrato de manutenção pago, portanto era necessária a certeza que as pessoas irão utilizar as copiadoras. Algumas oficinas são em vilas maiores, portanto a incerteza é menor.

Na ultima tarde do encontro fizemos um programa com planilhas de excel que eles deverão utilizar para controlar as entradas e saídas de dinheiro das oficinas... este programa foi motivo de reflexões nos últimos meses, já que vinha pensando no que poderia ser feito para que de maneira bem simples pudesse ser mostrado um resultado simples... porém durante minhas incursões solitárias neste trabalho cheguei apenas a resultados que me levavam a crer que seria muita complicação para uma contabilidade que não é feita nem um um caderninho... fazer o trabalho com eles junto levou a um resultado muito melhor já que além de poderem aprender um pouco de excel, eles me ajudaram a entender aquela realidade simples e chegar a um resultado simples. Passamos a ultima noite na também simples acomodação e terminamos o encontro pela manhá de maneira muito satisfatória, ajudado pelo telefonema do Bobby dizendo ter conseguido que o contrato de manutenção das copiadoras sejá gratuito, esta nova informação praticamente garantiu a internet para os lugares mais remotos. Me despedi de todos e saí caminhando pela estrada, seguindo sentido Vilankulos.

A viagem de Dombe a Vilankulos seria longa, com as devidas informações que haviam sido dadas pelos gestores fui andando pela estrada de terra, no que poderia ser uma caminhada de 45km até chegar a estrada nacional. Após pouco mais de uma hora uma pickup pequena, no estilo de uma saveiro ou coisa parecida passou, com umas 15 pessoas na caçamba... fiz o sinal clássico da carona com o dedo positivo e a pickup parou...

Quanto cobra para me levar até a estrada amigo?
Hundred meticais sir...
Para lá... cem meticais vou até Inchope, vou andando então...
Pera aí, paga quanto então?
Cinquenta eu pago...
Sobe ai!

E subi no que seria o primeiro transporte do dia... que andou por alguns minutos, até quebrar... pela primeira vez... Quebrou mais duas até chegar a estrada nacional, empurramos o carro, paramos num vilarejo para pegar agua pois estava fervendo... mas chegamos. Na caçamba fui conversando com os locais, que acharam engraçado o fato de eu, dito branco, estar lá no mesmo transporte. Chegando a estrada nacional, me abasteci de bananas e tomei alguns refrescos pois o dia estava quente e logo segui para a estrada para tentar um transporte para Vilanculo... Espera uma hora, pedindo carona para tudo o que passasse, e um Machibombo (microonibus) cansado demais parou para conversar...

Ola amigo, quanto cobra para Vilankulos?
600 Meticais...
Para lá, sou muzungo mas moro aqui tambem...
Paga quanto então amigo...
200 eu pago.
Sobe ai!

E lá subi e permaneci por umas duas horas, até a quebra do Machibombo. Enquanto estava lá junto ao motorista palpitando no conserto, vejo um babuino, muito grande cruzando a estrada... Puta merda! Vou pegar minha camera... Pego a camera e saio em passo rapido para a direção de onde atravessou o macaco... Quando chego proximo ao lado de uma pequena ponte (sobre um rio seco, como a maioria) vejo muito movimento nas arvores e olhando para o vale vejo que lá tem muitos, mas muitos babuínos... grandes, médios e pequenos, que ficam ao longe me olhando assustados enquanto tento um bom shot... cena linda, o sol ia baixando, um vale lindo, muitos macacos me olhando com a mesma curiosidade com a qual eu os olhava...

Voltando ao Machibombo, o motorista me diz que aquela região é cheia de macacos de vários tipos, e que aqueles babuínos que eu contemplava, muitas vezes ficam nervosos e é bom contemplar ao longe mesmo. Passados 40 minutos o Machibombo continuava lá em cima do macaco (hidráulico!) um caminhoneiro passa pelo local e me oferece carona! Muzungo power, as pessoas gostam de conversar com quem vem de fora por curiosidade mesmo e vou com o mestre e seus 3 ajudantes na boléia do caminhão pelas próximas 4 ou 5 horas... eles carregam madeira em um caminhão de carroceria dupla... muita madeira forte. Paramos em um lugar de venda de carvão vegetal no caminho e carrego o caminhão com eles, apesar de insistirem para que ficasse de canto para que não me sujasse, mas nesta altura já estava bem sujo da estrada na verdade. Muito prazerosa a viagem e as conversas com o mestre e seus ajudantes... muitas risadas demos juntos e ter vindo para um país que fale português, mas uma vez ajudou... Pelas 21:00 chegamos a Pambarra, ponto na Estrada nacional onde teria que conseguir mais algum transporte para Vilankulos... O sr mestre quer esperar me olhando para se certificar que tudo fica certo até que eu consiga novo transporte, porém o convenço que ele tem que continuar viajem, pois Maputo ainda são mais 10 horas de estrada... ele diz que vai tomar uns red bull e segue seu caminho...

Esta ultima etapa da viagem tive muita sorte, já que a estrada para Vilanculo não tem muito movimento e já era noite sem lua cheia, porém após uns 15 minutos de espera, um caminhão passou e me levou até a cidade... chegando lá não tinha dinheiro trocado para pagar a boléia, porém o motorista me deixou em uma barraca onde troquei meus duzentos e paguei seus 30 meticais... Chego a Vilankulos cansado, mas energizado pelo dia que passei, conseguindo chegar do ponto A ao B apesar das dificuldades normais por aqui, já que o transporte público e privado organizado são inexistentes. Em Vilankulos Andrea, amiga minha do IICD estava e havia conseguido uma acomodação na casa de uma pessoa da comunidade (muito linda a casa, no estilo palha e pau a pique como sempre) e portanto pude descansar sem ter que procurar lugar para ficar.

No dia seguinte seguimos para a praia, com as malas, já que queriamos ir para Bazaruto, maior ilha do arquipelogo de mesmo nome que fica entre Moçambique e Madagascar (muito mais proximo de Mozambique). Chegamos a praia e fomos procurar por algum barco de pescador que pudesse nos levar por um preço razoável... a ilha de Bazaruto é território protegido e o WWF (Aquela ONG do urso panda) faz patrulha da área para ter certeza que ninguém chegue lá por via diferente que uma das caras companhias turísticas de Vilankulos... porém esta aparente boa atitude de proteção não passa de uma maneira de tornar a ilha um território exclusivo para pessoas com muito dinheiro, como se perceberá nas próximas linhas. Conseguimos um barco de pescadores que aceitou nos levar para Vilankulos a preço justo para um barco de pescadores... grande experiência.

Os pescadores pareciam saídos de um filme de piratas na verdade... havia o comandante e dono do barco que fazia o papel daquele que já viajou por todos os mares e olha para o mar com os olhos de um filósofo.... havia aquele risonho, sobre o qual todos os outros ficam fazendo piadas, inclusive com sua touca característica na cabeça... também o jovem esperto e cheio de vontade de conhecer as coisas, perguntador que se interessa pelo desconhecido... o aprendiz, que está em suas primeiras viagens e fica com as tarefas de pouca responsabilidade. Todos eles tomavam rum, o qual fizeram questão de compartilhar, além de outras cositas típicas de bucaneros. A viagem deles era bem mais longa visto que ao passar a ultima ilha do arquipélogo, aquela na qual nos deixaram ,eles seguiriam para alto mar onde buscavam pescar tubarões e peixes grandes (os anzóis eram gigantes) e no mar permaneceriam por 3 dias e 3 noites até encher o barco, dependendo da sorte. Após umas 3 horas de viagem no barco a vela e motor, eles nos deixam em Bazaruto, longe da praia, pois se alguém do WWF percebesse o acontecido poderiam até mesmo apreender o barco, porém as águas razas e incrivelmente cristalinas entre as ilhas do arquipélogo não eram grande obstáculo e caminhamos em meio aos corais e peixes que coçavam os pés até chegarmos a praia.

Ao pisar em areia firme, percebo que a ilha não possui nada, nada mesmo no raio de visão e portanto os assuntos comida, água e acomodação começavam a preocupar, mas apenas começavam. Andamos, andamos e andamos, aproximadamente 6 horas pelas praias paradisíacas, com conchas enormes e nem um traço de civilização... após muita caminhada passamos por uma tribo, que na verdade não estava acostumada com o branco de maneira nenhuma, já que ficava fora do alcance dos turistas que frequentavam a ilha... estes nativos diziam que os brancos vinham a ilha para cortar a cabeça das crianças e com elas pescar tubarão, então podemos imaginar que eles não tinham muito amor pelo muzungo... ficaram muitos deles nos seguindo por bom trecho, nos tocando, nossas coisas e pensei talvez que estivesse fudido... uma vez que ali o que acontecer ali fica, mas após um tempo de caminhada sem atenção retribuída nos deixaram... perguntei em um momento se existia alguma acomodação na ilha e disseram em portugues quase ininteligivel que existia um hotel chamado, pelo que havia entendido, Ndigubê.. perguntei se era algo caro deixando a entender que tambem não tinha muito comigo, mas não consegui entender a resposta... seguimos caminhando.

Após mais muita caminhada, a mala começava a pesar uma tonelada e lá ao fim da ilha, consegui avistar o que pareciam pequenos chalés... caramba! Tem algum lugar para ficar aqui... o sol baixava e apertamos o passo agora mais animados pelos chalés que apareciam ao fundo... o por do sol, um dos mais lindos que ja presenciei ia ficando cada vez mais escuro e ao aproximarem-se os chalés, percebemos que não eram chalés e sim gigantescos guarda-sois. Ao chegar ao que já se mostrava um resort, o panico bateu, já que ele era obviamente impagável... casas luxuosas, com o pé na agua e apenas europeus como hóspedes...ja estive em hotel 5 estrelas antes, mas como aquele nunca vi... comprei um peixe com pescadores que estavam pouco antes do hotel e cheguei a conclusão que não seria boa ideia entrar no hotel com aquele peixe pingando sangue nas mãos... deixei o peixe muquiado no mato e entrei de mãos livres para me certificar que o hotel era mesmo impagavel... gigantescas salas de tudo que se imagina separavam a areia da praia da primeira recepção, um bar digno de filme... ao chegar na recepção sujo, com tenis pindurado na mala...as pessoas da recepção perceberam que não seriamos hospedes.. Ainda bem que eles eram moçambicanos.

Na recepção pergunto pelo preço do quarto... o mais barato USD 500!!. Puta merda, to fudido, vou dormir na praia com os nativos e agora alguem ja deve ter roubado meu peixe, portanto nao temos mais comida tambem.... faço uma choradeira na recepção até que o moçambicano que atendia entende a situação e me pede um minuto... me sentia nada a vontade naquele ‘ambiente europeu esbanjador em meio a uma ilha de pequena população absolutamente pobre.... o recepcionista (que falava alem de bom portugues mais algumas linguas) volta com uma outra opção, uma casa na comunidade por USD 200. Com certeza 200 dolares era bem melhor, mas ainda sim fora de cogitação, mesmo por que nenhuma casa naquela ilha (fora o Indigo Bay, nome do hotel que os nativos pronunciavam Ndigubê) poderia ser cobrado 200 dolares uma diaria, peço permissão para falar com o dono da casa pelo telefone e obtenho a permissão. Do outro lado da linha estava o sr Castilho, dono da casa e mais tarde a se descobrir um coração dourado, aquele tipo de presente que Deus reserva para os viajantes de bom coração... após explicar muito bem a ele a condição voluntária ele diz que pensava tratar-se de turistas europeus e nos presenteia com uma diaria de 200... meticais desta vez, o equivalente a 8 dolares. Bem melhor. Ele pede para que eu espere no hotel, pois viria nos buscar em seu quadriciclo, ainda ganhamos o transporte... saio correndo daquele hotel nojento em busca do peixe, não sem antes afanar algumas toalhas com fios dourados do banheiro e tomar uns 2 litros de boa agua... ao chegar lá fora percebo que alguem me viu esconder o peixe e o mesmo esta hora deveria estar sendo preparado para alimentar uma barriga mais faminta... tudo bem.

Após pouco tempo chega sr Castilho, com seu quadriciclo e leva Andrea, depois volta e leva a mim... chegando na casa, quase choro, Mamá (o jeito de chamar qualquer senhora, em qualquer lingua de Moçambique, e creio Africa) preparou comida deliciosa para nós... eles esquentam água para o banho e o quarto é extremamente simples e confortável, muito mais do que esperava nesta altura do campeonato... vou dormir com a certeza de que Deus proverá.

No dia seguinte acordo com um matabicho de rei preparado por Mamá... Enrico, filho do Sr Castilho se propõe a nos levar no quadriciclo para conhecer a ilha, caso paguemos o combustivel... logicamente fomos e a ilha realmente é espetacular... dunas e dunas de areia móvel, a depender da vontade do vento, davam um ar de sahara... entre as dunas, lagoas cristalinas convidavam a um banho caso não fossem infestadas de crocodilos.... entre a mata avistamos caprinos, macacos e cangurus (nao pergunte como chegaram lá) além de uma infinidade de pássaros coloridos e águias de cabeça vermelha... exuberante. Enrico para a moto na mata próximo as dunas e vamos caminhar... subimos dunas, descemos dunas até a exaustão, quando do outro lado aparece o índico.... verde claro..... maravilhoso com ondas dignas da profundidade que abriga os tubarões, baleias e golfinhos que vivem depois da ultima ilha, em mar aberto.... após um mergulho dou conta que algo começa a acontecer, sento na areia e aprecio o espetáculo .... milhares de caranguejos coloridos e transparentes saem da areia, da água, ao mesmo tempo.... Enrico explica que eles se reproduzem ali, na paz deserta daquele lado da ilha... sem mais palavras.

Voltamos em direção ao quadriciclo, porém nos perdemos por 1 hora na mata, pisando em cogumelos pontiagudos que incomodavam.... muito sol... achamos o quadriciclo e após alguns minutos de direção, o mesmo quebra... olha daqui, olha dali, Enrico desiste e peço permissão para tentar....acho um fusível queimado e descasco um fio de reserva com uma faca muito especial, substituo o fusivel pelo fio e ... vrummmm, a bagaça funciona e nos leva para casa de Sr Castilho onde Mamá preparou um almoço não menos delicioso que as refeições anteriores. Após o almoço vamos procurar e achamos um barco a vela que pudesse nos levar a Vilankulos de volta, já que estavamos totalmente ilegais naquela ilha... o resort foi construído onde antes era uma comunidade local (talvez por isso achem que os brancos cortem as cabeças das crianças para pescar tubarão) e o WWF está lá para se certificar que mochileiros como nós não vão atrapalhar a vista de povo nativo e oceano limpido dos srs barrigudos que chegam de avião(pequeno aeroporto no resort) e pagam as despesas daquele resort fétido. Este barco era apenas a vela e portanto dependiamos do vento que para a sorte soprava forte... olhando para o mar enquanto voltavamos, conseguia ver lulas, polvos, medusas coloridas e gigantes, porém o mais impressionante da volta foi uma briga de tubarões que me fez tirar o pé da agua e colocar de volta no barco...alguns tubaroes, em circulos pareciam brigar até a morte, ou algum tipo estranho de brincadeira.... ali mesmo, perto do barco.... barbatanas para cima e um espetáculo muito mais original que os tubarões enjaulados do Six Flags na California. Chegamos a noite a Vilankulos, com Andrea passando mal por causa de sua pressão e frio... tudo escuro na cidade sem luzes.... achamos uma acomodação barata para o próximo dia.

O próximo dia chegamos a conclusão que deveria ser calmo, já que o cansaço batia... ficamos lá em Vilankulos olhando as casas de arte e tomando cerveja gelada na praia, encontro o Yuni (filho da mulher que nos hospedou no primeiro dia) e vou com ele caminhar pelos bancos de areia a procurar conchas... na verdade não precisava procurar. Neste dia comprei várias estatuetas, pinturas... arte linda e barata... uma pintura a óleo, maravilhosa pela qual me apaixonei e custou a bagatela de 200 meticais mais a bermuda que eu vestia (fui a pensão trocar)... me encanta a arte local moçambicana e também a herança árabe local da negociação, onde todos ficam felizes ao final. Neste dia Andrea volta para Maputo e fico a espera dos outros DIs de Chimoio que estariam chegando a Vilankulos.

Domingo pela manhã ao acordar percebo que há uma igreja ao lado da pensão... tomo meu matabicho e fumo meu cigarrinho ouvindo os lindos cantos que me dão uma imensa paz de espírito... deixo a pousada e vou com minha mala, tenis pendurado e tudo mais ao encontro dos DIs de Chimoio que voltavam e me dariam carona para a EPF... tomamos uma cerveja, jogamos conversa fora e pegamos a estrada, no carro de um chinês injuriado, no qual escrevo agora.... não me pergunte de onde eles sairam... sei que apareceram DIs de Chimoio e um chinês, ele tem uma Land Rover e estou dentro dela voltando para casa.

And I think to myself, what a wonderful world.

Abraço

P.S – Grande demais o post né... logo mais mando as fotos.

Sunday, October 18, 2009

Capacitação e cansaço

Ola,

Após grande pausa, uma volta ao blog...

Me sinto um pouco cansado. Trabalhar aqui trazendo a cultura ocidental e tudo mais que a acompanha é um esforço que corre junto a frustração o tempo todo. Muitas vezes me pergunto, será que é realmente necessário? Será que as coisas que tenho a oferecer quanto a tudo, sobre a cultura a qual venho, são realmente necessárias por aqui?

Ao ver alguém dito branco, as pessoas sempre vem com aquilo que precisam de uma forma ou de outra... ‘estou a pedir uma ajuda para fazer este trabalho’ ou ‘estou a pedir uma ajuda para mandar um email’ ou ‘estou a pedir esta sandália’ ou frequentemente ‘estou a pedir mili (um metical)’ ... Isso faz com que sempre que se esteja fazendo alguma coisa, haja uma grande probabilidade de ser interrompido,o que não seria problema caso houvesse um real interesse...

Quando alguém me pede para arrumar um computador que está com um problema ‘x’ qualquer eu sempre tento ensinar a pessoa como fazer... porém após 10 segundos de explicação a pessoa já está dormindo... a falta de vontade e de concentração aliadas ao fato que eu posso fazer o trabalho, levam a um estágio amorfo em que as pessoas criam uma certa angústia em você :
_entendeu?
_entendi... sim, claro!
_o que eu disse?
_oi, tava a falar comigo?

E sempre assim, acredite...

Portanto, percebe-se que não há um real interesse nas pessoas em aprender sobre alguma coisa que não faça parte da cultura daqui e tenho que confessar que as atividades aqui não são muito variadas... machamba (agricultura), música, dança e esportes... o resto é muito complicado e com rarissimas exceções as pessoas se deslumbram por alguns segundos, até o momento em que se desinteressam e a atenção fica dispersa...

Como já disse algumas vezes, ocidentalizar um lugar como Moçambique é um crime, eles possuem uma identidade muito forte como povo e tradições que remetem ao surgimento do homem... porém estas tradições tão milenares trazem danças maravilhosas, músicas maravilhosas, mas não traz água encanada, não traz esgoto e não traz alimento em um nível mínimo para todos. Para que as pessoas por aqui cheguem a esse nível mínimo de conforto (já que eles sabem que vivem muito mal em meio a todas essas necessidades) com certeza a fórmula mágica não virá de um branco ocidental que chegue aqui com a melhor das intenções... nós aqui somos sugados em toda nossa energia e o resultado final é que por enquanto estamos aqui, as coisas que trazemos funcionam, viramos as costas e acabou... como ninguem se interessou em aprender e nós estavamos aqui para fazer, basta ir embora e acabou.


Durante estes muitos dias em que não escrevi nada, um projeto que foi deixado por outro DI em minha mão levou muito de minha energia...Fabio conseguiu verba para a construção de um forno na escolinha em que dou aulas (formigas do futuro) e não teve tempo de começar a organizar como seria a produção, venda e tudo mais... fiquei com esta responsabilidade e a frustração vai correndo junto ao sucesso como sempre... o pão da escolinha deve ser vendido a EPF (escola que forma professores para as escolinhas) porém os próprios alunos, professores ano que vem, foram o maior empecilho inicial. Nos primeiros dias, por fofocas e conversas sem sentido (como já disse, aquela fascinação absoluta pela vida do outro) os professores resolveram não gostar do pão... então se ‘rebelaram’ contra o novo pão e chegaram até mesmo a atirar o pão no chão... Agora a padaria está funcionando e depois de muita discussão, a EPF está comprando os pães como combinado... ainda vou falar melhor deste projeto quando tiver confiança que ele deu certo, acredito eu ... ou errado.

Semana passada tive o curso de Hardware aos gestores de oficinas pedagógicas de Manica... foram 18 alunos, 5 dias e 10 horas por dia que realmente foram cansativas ao final... muito conteúdo, muito conteúdo novo e infelizmente pouca base para avançar bastante no assunto. Os gestores são pessoas mais bem informadas com certeza, porém a maioria nunca tinha pensado em como um computador funciona fisicamente e começamos bem do início mesmo. Foi muito boa a capacitação na verdade.

Durante as aulas percebi que alguns deles realmente tem potencial e podem tornar-se técnicos mais para a frente, caso continuem a se interessar... Prestavam muita atençao, faziam muitas perguntas e ao final conseguiram montar o computador sozinhos e uma pequena rede também. Outros alunos se interessaram muito, queriam realmente aprender, mas por falta de base a ‘coisa’ não adentrou a suas mentes... já outros alunos, com os quais parei de me preocupar no primeiro dia não queriam saber de nada além de dormir ou fazer barulho...

Ao final fizemos uma prova, teorica e prática. Como eles receberam certificados da ADPP não facilitei muito a vida e ao final 5 não puderam receber o certificado por não alcançarem o mínimo na prova... combinamos que eles iriam estudar as apostilas que distribuí, e em breve iremos fazer uma segunda prova. O resultado foi melhor do que o esperado, ao final pessoalmente percebi que minha imensa paciencia é na verdade um pouco maior do que eu pensava... ainda pessoalmente fiquei satisfeito também por ter aguentado a carga horária frenética sem nenhum desmaio. Para todo o grupo, creio que aqueles que queriam aprender alguma coisa aprenderam... em níveis diferente mas aprenderam, tanto é que por coincidência ou não, os 5 que não receberam os certificados foram os mesmos que se interessaram em recuperar o sono atrasado.

Amanhã, segunda feira, viajo para Dombe ao sul de Manica para um encontro com os mesmos gestores a fim de adequarmos algumas coisas nos projetos de geração de rendimento das oficinas (jeito moçambicano de dizer) e para uma breve capacitação em Excel... lá ficarei até quinta feira, quando vou para Vilancullos, a praia que dizem ser o lugar mais lindo de Moçambique, num arquipélogo de ilhas de areia, com golfinhos, baleias e um gigantesco coral de recifes... a final, sou um ser bem humano e mereço meu descanso....

Um grande abraço e até a próxima.




P.S - Algumas fotos da capacitação, logicamente não tiradas por mim visto que apareço nas mesmas!


Friday, October 2, 2009

e invertido


Ola,


É isso aí, agora quem gosta de esporte mesmo lá no fundo vai voltar seus olhos para o Brasil entre 2014 e 2016. Agora é só desconsiderar todo o pessimismo e mostrar que é possível trabalhar para que esses jogos tragam benefícios reais para a sociedade.
Sem esquecer de acertar tudo com o tráfico.
Esse mundo ta de cabeça para baixo.








P.S - Modifiquei o layout do blog para visualizar as fotos... como as dos EUA e da Africa estao juntas, coloquei uma foto mais condizente com a realidade... portanto clicando no gingado do Bush voce acessa as fotos.


Wednesday, September 30, 2009

Moçambique

Moçambique nossa terra gloriosa, pedra a pedra construindo um novo dia, milhões de braços uma só força. Ó pátria amada vamos vencer.

Conversando, todos dizem que esta região de Moçambique onde estou é uma das melhores do país. As montanhas que se erguem de maneira majestosa em meio a savana, propiciam uma brisa que afasta um pouco o calor africano que está quase sempre a suar e queimar a pele, além do que oferecem um grande entretenimento de domingo para aqueles que gostam de andar pelas comunidades conhecendo a região e terminar a caminhada subindo uma montanha. Além das condições climáticas e geográficas favoráveis, o povo da província de Manica é muito acolhedor e amigo, fora o estranhamento muzungo que por vezes incomoda ambas as partes, me sinto sempre seguro e confortável com o povo daqui.

Quando estive em Maputo por alguns dias (Maputo fica próximo a África do Sul) não me senti tão confortável assim. A cidade é daquele tipo que fica grande sem saber o porque, muita gente vivendo em um espaço que não provê estrutura ou condições de morar, comer ou se locomover. Não pude ir a muitos lugares, já que o transporte é um martírio, lembro de um dia que saí para conhecer o centro mesmo da cidade, e fiquei lá andando, entrando em mesquitas, lojas e etc... quando vi o sol já estava em seus ultimos momentos de raiar. Comecei aí a procurar por um chapa que me levasse de volta para o bairro onde fica a casa dos DIs, mas este era o chapa que menos passava... e quando passava estava em situações que não havia como pensar em entrar ali. Esperei 1, 2, 3 horas até que passasse um chapa em que eu pudesse entrar com um mínimo de dignidade, mas bem mínimo. Como já disse os chapas são um tipo de lotação, mas muito pior, e os de Maputo em especial, tem um Q de crueldade já que as pessoas vão sentadas, depois pilhadas em cima das sentadas e depois para fora, apoiadas em cima das que estão pilhadas. Enfim, depois de esperar por 3 horas fui na categoria pilhados, e estava me equilibrando, deixando os joelhos duros e me segurando no assento do motorista com uma mão e apoiando no teto (que estava a 2cm da cabeça) com a outra, me esforçando para não sentar, literalmente no colo de um rapaz que estava na posição dos sentados... após observar a situação pela qual eu passava, num esforço hercúleo para não sentar em seu colo, o rapaz disse... tudo bem amigo, pode sentar... mas eu me mantive forte até chegar a meu destino. Resumindo, Maputo não é uma cidade muito amigável.

Em um feriado viajei a Beira, praia que fica ao oriente de Chimoio coisa de 5 horas, lugar lindo... as praias do oceano índico, muito salgadas e nem tão cristalinas, mas não por sujeira e sim pela areia pesada. Lá em Beira existem dois navios (que já enviei as fotos) que encalharam na areia e por lá ficaram, enferrujando e abrigando crustáceos... estes barcos juntos ao farol davam um tom meio surrealista a praia do Estoril (eee Portugal) aonde há uma vila de pescadores que trazem grandes camarões (parecem lagostinhas) e vendem o kilo por Mtn 150,00 (USD 5), além de peixes grandes, saborosos e baratos. Em Beira as pessoas são um pouco mais malandras, praieiras ou algo assim... durante a noite muita gente se aproximava dos muzungos no bar... e ofereciam uma putaria ali... um taxi aqui... sempre deixando aquele sentimento de golpe no ar.

Estas três cidades que mencionei formam um triangulo, onde Maputo está embaixo, Chimoio a esquerda e Beira a direita... daqui para cima... the Bush baby... mata, selva e animais... ainda terei a oportunidade de ir a alguns lugares ao norte, creio que eles serão ainda mais longes daquilo que em terras ocidentais chamamos civilização. Que bom.

Moçambique é um país uniformemente pobre... extremamente pobre... quando digo pobreza me refiro a falta de água, alimento, esgoto, estradas, transportes, comunicação (exceto celular)... um vasto portifolio de doenças, pestes, epidemias.... mal nutrição... o povo daqui sofre e muito, isso não é localizado é em todo o lugar.

Esta situação de pobreza é a consequência de muita coisa que deu e daria muitos livros, porém tem um cheiro no ar que me lembra muito um problema bem brasileiro... a merda do ‘jeitinho’ que pode ser chamado de corrupção... acomodação ou coisa parecida, então esse mesmo, mas assim como a maioria das coisas aqui exagerado... Talvez o passado em comum sobre assuntos como Portugal, escravidão, colonia etc, crie esta vontade de ser muito esperto que acaba por deixar que os mais espertos nos enganem.

Aqui na ADPP eu me deparo as vezes com situações que não acredito... a situação acontece, eu olho, reflito e não acredito. A falta de vontade sobre as coisas é impressionante e me assustou muito nas primeiras semanas, a grande maioria simplesmente don´t give a shit. Alguns professores e funcionários daqui veem os DIs como uma grande oportunidade de fazer um pouco menos e tentam jogar seu trabalho em cima de nós, se você aceitar, passa aqui um tempo fazendo o trabalho deles... No caso de você precisar da ajuda de alguém em algo que demande mais que 2 minutos de atenção ... ishhh yowê, vai ser difícil. Essa parte lenta da coisa as vezes me deixa perplexo, mas as vezes me faz pensar, será que eu que estou errado? Oras, eles estão aqui, vivendo muito mal, na minha opinião... mas essa é a minha opinião... eles não conhecem o que eu conheço como civilização então para eles aquilo é algo que passa na novela brasileira a noite. Talvez me preocupo demais, mas confesso que continuo com a mesma opinião.

Andar pelas ruas de poeira de Moçambique (asfaltadas geralmente só as principais dos centros e as 6 rodovias do país) é um flerte com a fama, isso para um muzungo. Praticamente todas as crianças (que são muitas) que encontro, ou acenam, ou vem e pegam na mão ou fazem uma brincadeira ou coisa assim, na verdade o mesmo acontece com os adultos. Esse negócio de pegar na mão me intriga um pouco, já que a sociedade aqui é extremamente machista... um homem pode ter várias mulheres, a mulher é considerada pelos homens um tipo de nada, não existem gays ou eles se escondem muito bem... mas nas ruas é muito comum ver homens de mãos dadas e vira e mexe um quer andar de mãos dadas comigo... é uma cena estranha, mas bem comum que já me habituei a ver... as crianças sempre andam de mãos dadas, brigam muito mas estão sempre de mãos dadas, são pessoas muito carinhosas na verdade.

A população é muito jovem por dois motivos principais (sempre eles), as pessoas se reproduzem demais, muito cedo e também morrem muito cedo. Não é fácil ver pessoas realmente velhas, e quando você pensa que elas são velhas, na realidade são marcas de uma vida difícil. A má nutrição e a AIDS são as principais causas (1 em cada 5 moçambicanos tem AIDS) e isso reflete em uma sociedade com muitas crianças órfãs, que são criadas por outros parentes ou ficam pela rua ou em orfanatos. É muito difícil crescer em recursos quando as bases são essas, as crianças muitas vezes não tem quem as eduque, o déficit de professores é enorme e aqueles que se propõe ao ofício infelizmente não tem uma formação adequada. O fato é que vejo aqui algumas iniciativas internacionais que tentam alguma coisa, ou fingem... um governo que paga em dívida mais do que em saúde e educação juntos e condições de crescimento muito difíceis, mas nada é tão fácil assim.

Moçambique tinha reinos poderosos na época das primeiras explorações portuguesas... o império de Gaza ao sul e o Monomotapa na região central onde estou eram prósperos, porém assim como toda a África, por condições internas, foi sujeito ao tráfico de pessoas e posteriormente a pilhagem européia. Durante os anos de ocupação portuguesa nos séculos passado e retrasado, dizem que muita coisa foi construída aqui e realmente a quantidade de ruinas é muito grande, acontece que segundo a historia (por que segundo ao Coutinho, que é português, Portugal só trouxe prosperidade) após a saída portuguesa forçada de suas possessões africanas, os mesmos destruíram tudo o que tinham construido com as riquezas do país e deixaram como herança uma guerra de desestabilização que foi uma das mais sangrentas do pós neo-colonialismo na África... as facções que depois se tranformariam em Renamo e Frelimo, os dois partidos majoritários, guerrearam pelo domínio do país ao ponto em que tudo o que existia foi destruído. A guerra acabou em 1994 e portanto Moçambique é um país em reconstrução.

Em Outubro acontecerá a eleição para presidente no país, o mandato é de 5 anos e o sr. Emílio Guebuza, atual presidente e partidário da Frelimo será reeleito pela grande maioria dos votos. Nas ruas se encontra a cada 10m alguem fazendo campanha para a Frelimo, mas nunca vi ninguem fazendo campanha para a Renamo. A Renamo é o partido dos portugueses que desestabilizaram enquanto a Frelimo é o partido dos Moçambicanos que lutaram pela independencia (contando a história política com se fossem quadrinhos) portanto a eleição é um tipo de validador para esta nova ‘democracia’ da República Popular de Moçambique (ufanista) que elegerá a Frelimo em Outubro.

Estando longe do Brasil, hoje em dia tenho outra idéia de Brasil. Aquele lugar que talvez seja o mais perfeito com todos os seus defeitos, é realmente um país abençoado, onde apesar de encontrarmos muita desigualdade e guerras internas temos em geral uma vida muito boa, cheia de oportunidades e possibilidades. Os jornais que tenho lido (não brasileiros) colocam o Brasil como um dos países mais independentes da política mundial para sua prosperidade (NYT) ou como uma potência política consolidada no ocidente, junto aos EUA (Times) e isso foi mostrado essas semanas com o caso do presidente hondurenho. Nos tempos recentes o Brasil passou a ter também outra importância política no contexto mundial e acredito que isso pode ser muito bom para nosso povo criar aquilo que ainda falta um pouco, que é a identidade brasileira, de um povo forte, cheio de defeitos, mas que convive em paz, trabalhando e buscando ,por mais que as vezes não pareça, uma situação melhor. Nos Estados Unidos comecei a perceber que eu como brasileiro, não dava o devido valor ao meu país... os made in EUA admiram nosso país e aquele negócio de que vivemos na selva na verdade vem de gente ignorante, aqueles que possuem mais conhecimento sempre diziam alguma coisa de bom sobre o Brasil, nunca ouvi nada ruim, se eu fosse made in EUA isso seria diferente.

Aqui em Moçambique, nós somos o primo rico. A cultura brasileira tem sido muito difundida por aqui, por meios torpes como a televisão, mas por meios mais dignos como boa música, profissionais (médicos, professores, engenheiros), escritores e empresas. Grande parte da pequena estrutura que vem sido criada é feita por empresas brasileiras como a Odebrecht ou Andrade Gutierrez, os aviões das empresas moçambicanas são Embraer. Como nem tudo são flores também tem muitas igreja universal do reino de Deus. Enfim, o que queria dizer sobre o Brasil em meio ao post Moçambique, é que essa simpatia e admiração (acredite) que o mundo todo tem por nós, nos abre portas que muitas vezes não sabemos que estão ali. Se você ai no Brasil trabalhar durante algum tempo com um salário médio vem para Moçambique e vira empresário... aqui tem muito o que crescer e isso vale para outras esferas também, os brasileiros são muito bem vindos na reconstrução deste país e não por filantropia mas por simbiose já que nós que estamos economicamente e socialmente também mais ‘avançados’ podemos contribuir para o avanço de tantas nações que necessitam de ajuda externa, tendo talvez o papel que um dia já foi dos EUA, mas desempenhando este papel de forma diferente, mais brasileira (ah que medo!!!). Uma coisa seria muito boa para todo brasileiro... se desvenciliar da imprensa de massa de nosso país que fatura em cima da ignorância e faz questão de mostrar um Brasil pior do que ele é... leia um pouco da imprensa internacional (nem todos os dias) e veja o que dizem do Brasil...

E viva Moçambique!

Aquele abraço

Wednesday, September 16, 2009

Um pouco de trabalho, lagartos e crocodilos

Ola,

Um post rapido...

Primeiro digo que consegui carregar algumas fotos e criar um albúm novo... O albúm eh chamado Moçambique, mas graças a lentidao da net por aqui não reconfigurei o blog e portanto para ver as fotos de Moçambique, clique na bandeira dos EUA! São poucas fotos e tenho centenas que ainda não adicionei, mas vou mandando pouco, pouco, como se diz.

Agora estou podendo fazer um pouco mais, na verdade nas primeiras semanas ainda por conta da malaria estive me sentindo um tanto quanto inútil, gastando meus recursos e precioso tempo. Não digo que é ruim estar aqui, pelo contrário, conhecer este mundo que para mim fazia parte apenas de livros... mas depois de tanta coisa nos EUA para vir para cá, quero fazer alguma coisa que valha a pena e essa história de muzungo que vem para a Africa ‘fazer a diferença’ já me deu nas bolas. A maioria de nós vem para cá e por uma razão ou outra fica num Safari de 6 meses com pequenas intervenções . Na verdade não é fácil, de boas intenções o mundo está cheio como diria um velho deitado, mas a realidade aqui ao mesmo tempo que abre muitas oportunidades para bons olhos, fecha muitas para nem tão bons, já que as pessoas mesmo não querem mudar muita coisa, como disse, trazer rede de supermercado, lanchonete e outras coisas que estamos acostumados para cá seria um crime, mas água encanada, estrada e energia elétrica não seria suficiente para tirar a identidade do lugar e faria as pessoas poderem pensar em outras coisas. Se perde horas buscando agua ou indo para a cidade.

Como todas as oficinas pedagógicas possuem computadores e dinheiro, já que a Kellogs patrocina, estou fazendo um programa que gerencie as entradas e saídas das oficinas, pois acreditem ou não, NADA é contabilizado, muitas vezes se pede dinheiro para tal coisa e ninguém nem anota em lugar nenhum... ora... quando as coisas funcionam assim das duas uma, ou ninguém se importa com o dinheiro (difícil) ou tem gente ganhando com isso (muito mais real). Essa semana descobri que a segunda opção é uma certeza, só não sei como se presta contas a Kellogs... ok posso imaginar.

Nas primeiras conversas sobre a implantação do sistema nas 10 oficinas da província de Manica, que farei em Novembro provavelmente, percebi que não será fácil fazer com que a ferramenta seja mesmo utilizada, o fato de não haver contabilidade me dá a certeza que o dinheiro não é utilizado para aquilo que é ganho, nem a verba da Kellogs ou de NENHUM dos projetos de geracao de renda, como as machambas, ou serviços de informática, ou pasmem! cursos... já imaginou algum lugar que dá cursos, o dinheiro entra e ninguém sabe o que é feito... ou para onde foi... ou pior, o quanto foi.... pois é, assim mesmo. Conversando sobre cade o dinheiro? as respostas mais ultrajantes para a inteligência alheia foram dadas... só faltou ouvir: Não é da sua conta. Mas infelizmente é da minha conta e quero incomodar com isso.

Ainda sobre as oficinas pedagógicas, temos 35 computadores, dos quais 34 estão parados! Computadores novos... configuração boa... parados. Coloquei 10 para funcionar hoje na oficina daqui e os outros ainda ninguém conseguiu me dizer satisfatoriamente para onde vão. É assim que as coisas funcionam aqui, hoje também arrumei um depósito que a oficina tem, cheio de produtos de informática, esportes, aulas... advinha! Nada de inventário, as coisas entram, as coisas saem, ninguém sabe de nada.

Sei que o padrão moçambicano não permite muita organização, mas vá a merda isso já é estupidez, ou muita esperteza.

Falando de coisas muito melhores... as crianças... como é gostoso dar aula para elas... e para mim não tem sido muito difícil, já que não sei bem porque, se pelo fato que sou diferente fisicamente, ou pela minha maneira de explicar as coisas ser totalmente diferente dos professores daqui, por falar coisas que elas nunca tinham ouvido antes, ou por tudo isso junto, elas prestam uma atenção na aula, que tenho certeza que não conseguiria ter no Brasil. Enquanto falo e enceno, elas ouvem, perguntam, fazem cara de descobrimento... vem depois da aula e me perguntam... é verdade que existem esses vulcões... ou me explica de novo como é que se formaram aquelas montanhas... ou qualquer coisa... acaba as aulas, algumas como o Adão ou o Capitão vem comigo até quase minha casa, perguntando sobre um monte de coisas, muitas das quais não há resposta para, inclusive. O nível é muito baixo, na minha sala de 7 classe tem criancas com 12 anos até 18... algumas com muita dificuldade de aprendizado, algumas que se destacam demais, se interessam demais, querem saber muito. Infelizmente não tem muita oportunidade. O professor Cláudio agora fica bem quietinho nas aulas que assiste e percebi na ultima que ele anotava as coisas que eu falava, acho que foi um avanço.

Ah sim, sobre os lagartos e crocodilos, no fim de semana fomos a um parque de crocodilos em Messica, uma cidade próxima... muitos crocodilos pré históricos, num lugar que lembrava muito o cerrado... não me arrisquei a mergulhar no rio. hehe. Domingo uma andança para a montanha mais próxima daqui... na verdade eu e o Rodrigo iamos a cabeça do velho onde se vê o Zimbabwe, mas no meio do caminho encontramos o Abdul (um menino da escola) que disse nos guiaria para lá, já que é uma caminhada na mata de 2horas e meia... vamos lá Abdul... mas ele se confundiu e nos levou para outra montanha (acredite!), tudo bem, a vista era boa e no caminho muitos lagartos... pequenos, mínimos, médios, dinossauros... brancos, pretos, coloridos... isso ai.

Até que não foi tão curto

Aquele abraço

Wednesday, September 9, 2009

Algo bom a fazer

Ola,

Depois de alguns dias com bastante preguiça de computador cá estamos de novo, em uma noite de lua laranja ouvindo um bom chorinho.

Em um dia da semana passada que não me recordo qual, Bobby me liga a noite, quando já estava a dormir (jeito moçambicano) e me pede para ajudar a preparar uns computadores para a feira de tecnologia de Chimoio... quando ouvi a informação ela me soou estranha, mas estava meio dormido, então acordei as 6:00 como combinado graças a meu telefone despertador. Pela manhã já acordado a notícia me soou um pouco mais estranha ainda... feira de tecnlogia em Chimoio? Converso com o Bobby que me informa um pouco mais sobre a tal feira e me mostra a proeza que deseja eu execute... instalar o sistema que funciona em um computador cliente, com servidor lá nas terras frias dinamarquesas em um computador normal. Esse é o sistema que os alunos da EPF utilizam para dirigirem seus estudos e as matérias pelas quais se interessam, o nome é DMM e na verdade ele é bom mesmo... as pessoas que o utilizam tem acesso a uma base de dados gorda, sobre praticamente tudo que se imagine e podem escolher um tema que vai de lições bem básicas a exercícios mais avançados... a maioria das não muitas vezes que o utilizei nos EUA buscava lições de agricultura, matéria pela qual comecei a me interessar lá, mas ainda sou uma grande anta.

A instalação do sistema e da biblioteca digital (com uns 1000 livros) demorou um dia para ser feita, configurada e tudo mais... uma grande canseira mas terminada no dia, já que a feira seria no seguinte.

No seguinte a grande feira... chegamos as 7:00 a.m por que era o horário marcado e Bobby não gosta do horário moçambicano. Porém os moçambicanos ... aaahhh como eles gostam. As 7:00 logicamente não havia ninguém montando nada ainda e demorei uns 15 minutos, para com ajuda de um senhor que agora me foge o nome, montar nosso grande stand, armado em cima de uma mesa capenga coberta com uma capulana, o local, o clube muçulmano de Chimoio. Se o caro leitor acompanhou a linha do tempo, as 7:15 já não tinha mais o que fazer e o fato de que a feira começaria as 2:00, que acabara de descobrir, começava a me preocupar mesmo por que esqueci de pegar o livro que estava lendo e meu celular só tem o jogo da cobrinha que vai comendo bolinhas de não sei o que no caminho... passa uma manhã infinita e pelas 2:00 as pessoas entram na feira finalmente, porém havia sido dito que a governadora da província de Manica estaria lá para ‘cortar a faixa’ porém... a governadora é moçambicana.

Os ‘stands’ tinham variadíssimos temas e descobri que não se tratava de uma feira de tecnologia mas sim uma feira de qualquer coisa que tivesse a ver com desenvolvimento... então estavam lá 2 faculdades, outras ONGs, senhoras que tinham raízes para qualquer problema, armadilhas ninjas para caçar cobras e etc... Foi uma tarde agradável, fiquei com 2 estudantes explicando para quem interessasse sobre o que é o DMM, biblioteca digital e o trabalho da EPF... a governadora (fato que me surpreendeu, já que mulher aqui não é muito respeitada) que é bem moçambicana chegou as 5:30 para cortar a faixa e quando terminou de passar em todos os expositores a feira acabou... naquele dia, já que nos 2 seguintes continuaria, porém não para mim visto que tinha terminado meu trabalho, tudo funcionava e os estudantes são aptos a explicar sobre sua ferramenta de estudo de maneira satisfatória.

Nos dias que já eram fim de semana, motivados pelo fato que segunda, 7 de Setembro (ahhh Brasil!!!) também é feriado aqui (dia dos acordos de Lusaka que foram parte do processo de independência de Moçambique, Zâmbia e Zimbabwe) todos nós DIs fomos a uma casa de outro projeto da Humana que fica em Beira... uma praia muito gostosa, no melhor estilo bahiano, porém no oceano Índico e com o atrativo de possuir em suas areias os restos de 2 navios, um bem grande, abandonados lá desde tempos que não sei quais. Os navios a frente do farol davam um tom meio surrealistico para a praia e a água de cor mais escura e bem salgada, porém limpa, era bem diferente da suja que tinha perto da casa dos DIs... para a praia chapa é claro. Outra coisa curiosa sobre aquela praia era a água brotando da areia, no limite de onde a maré cheia chegava... me lembro de ter visto isso uma outra vez no Rio Grande do Norte e na verdade não sei o porque aquilo acontece, sei que em lugares onde haviam pedras maiores, a água chegava a jorrar. Peixinho na brasa, sol de rachar o coco e um primeiro contato com o índico que ainda pretendo conhecer mais, o soldo que a Humana paga não é nada quando convertido ao USD por exemplo, mas por aqui é mais do que suficiente, ainda mais por que sempre se consegue carona e para voltar viemos na boléia de uma pick up que tinha até cobertura. Carona de luxo!

Ontem pela manhã a primeira aula com as crianças na escola infantil da EPF, Formigas do Futuro... para elas, ciências sociais do professor Muzungo (brincadeira). Estava meio nervoso com certeza mas passou depois de um animado “bom dia querido professor!” e fiquei lá com elas na próxima hora explicando sobre o continente americano, os oceanos que banham... um pouco sobre o descobrimento do continente e como a América influi na história da Africa pelo colonialismo, porém de maneira um tanto quanto básica, por que percebi o que já tinha percebido, o nível não é de uma 7 classe como no Brasil. Não que o ensino no Brasil seja muito bom, não.... mas pelo menos tem um sistema de ensino que ainda que capenga é melhor do que a completa bagunça. Deixando de lado sistema de ensino e limitações acho que foi uma boa primeira aula, as crianças ficaram bem quietinhas enquanto eu falava, e bem faladeiras na hora que era para elas falarem. Acredito que a idéia seja que para cada conteúdo que o livro indica como o curriculo deles, deve-se partir do ponto 0e tentar ao máximo ser simples na explicação sem ser autoafirmativo (como os professores daqui) ou tratando a criança agindo como uma. Nunca fui educador e para mim isto não é e não será fácil, porém assistindo outras aulas lá na escolinha e pelas intervenções do professor que acompanhava minha aula, percebi que posso trazer algum benefício... os professores que me desculpem, mas lhes falta muito conteúdo, muita humildade já que falam asneiras inimagináveis como se fosse uma verdade universal, e muita didática já que algumas vezes por aqui penso na escola que meu pai sempre me contou frequentava quando criança... Uma cabana, com um professor gritalhão que não controla os ânimos pelo que está explicando, mas sim por berros ou objetos atirados (!). Hoje não sei, mas senti uma perplexidade por parte do professor que acompanhava minha aula, as crianças pareciam interessadas, me arrisco a dizer que realmente estavam... ficavam quietinhas e tentavam responder as perguntas que deixava no ar... por vezes ele fazia intromissões com gritos sem sentido, repetindo uma decoreba que poxa vida... num funciona né... algumas vezes cheguei a pensar que ele queria tumultuar o que tava harmônico. Foi uma boa experiência e toda segunda, terça e sexta estaremos juntos, como se diz por aqui...

É isso aí, a lua já se moveu bastante e a preguiça de computador ataca novamente.

Aquele abraço

Sunday, August 30, 2009

A Morte do plasmodium e outro ritmo de vida

Ola,

Morra protozoário de uma figa!!! Morra!

Depois de alguns dias de uma estranha dor de cabeça e cansaço corporal, me sinto bem novamente e creio que a medicação contra a malária tenha funcionado... no começo da próxima semana voltarei ao ‘laboratório’ para testar novamente (com seringa nova) se restam traços deste protozoário incoveniente em meu sangue.

A semana foi relativamente lenta para mim pois tinha que repouzar e ficar meio quieto, porém percebi que não foi tudo lento somente por minha vontade, o ritmo aqui é muito mais lento do que na Bahia, por exemplo... Os horários são algo bizarro, marca-se algo para as 15hrs porém as 17:30 começa a discutir se aquilo que era para ser feito as 15hrs deve ser realmente feito... lá pelas 19:00 chega-se a conclusão que ... não, melhor deixar como está pois pode ser que venha a se perder muito tempo fazendo aquilo... Isso não é exagero, funciona assim mesmo e as vezes um pouco pior... no dia que voltamos das olímpiadas das EPF por exemplo, o ônibus deveria partir as 16:00 porém pelas 19:30 começou a entrega de troféu! Pelas 21:00 o ônibus partiu… é o padrão.

A completa ignorância a horários marcados reflete na verdade uma falta de compromisso de muitos com aquilo que deveria ser levado a sério.... ontem por exemplo fui a inauguração de uma pequena biblioteca feita com a ajuda do Luís, um DI brasileiro aqui da EPF, em uma escolinha para crianças bem pequenas dentro da comunidade de Nhamatanda ... a escolinha é na verdade uma cabana um pouco maior, com algumas carteiras que o Fábio, meu companheiro de quarto italiano conseguiu para as crianças e um professor, o Inácio, que é uma dessas pessoas apaixonadas que não ganha um tostão e dá aula de tudo para a mulecada, consegue dinheiro para comida e tudo o mais... Ficamos lá dentro da escolinha, sentados na frente das crianças, junto ao quadro negro... eu os amigos já citados e o Rodrigo... falamos algumas coisas para as crianças até que chegam os representantes da comunidade, um pastor evangélico (vocês não imaginam quantas igrejas evangélicas existem por aqui... Record é um canal aberto e passa novelas da GLOBO!!!!!!!) e um senhor representante do bairro Nhamatanda... o estado deste senhor foi algo que me envergonhou profundamente, o ‘representante’ da comunidade estava bêbado, mas bem bêbado mesmo... falando nada com nada lá na frente das crianças.... olhávamos um para os outros incrédulos com aquilo, mas na verdade nem tão incrédulos assim pois infelizmente isso é visto com certa normalidade.

Ao chegar na EPF as duas primeiras semanas são para ambientação e para se adequar a realidade daqui, que é bem particular... conhecer as comunidades, escolas, cidades e etc... porém me cansa um pouco ficar olhando e portanto adiantei meu processo um pouco com o Bobby estes dias para já começar a fazer alguma coisa de verdade... como estava me comunicando bastante com ele antes de chegar aqui pudemos definir em linhas gerais o que eu vou fazer e aonde... agora na segunda feira começaremos a definir horários (já que nem eu, nem ele somos moçambicanos) e tudo o mais...

Na escola EPF que prepara os professores que vão para as escolas de ensino médio (nome brasileiro) vou dar aulas de estatística básica para os professores dos professores, já que estes nunca tiveram aulas de Estatística, porém vivem colhendo dados para que as mesmas sejam feitas... recebem os resultados e nem olham direito para eles... para eles também vou montar um curso curto de introdução a Economia.

Na escola formigas do futuro que também é da Humana, porém para crianças orfãs até a classe 7 que chegam a ter até 17 anos, vou dar aulas de ciências sociais e esta na verdade é uma das funções que me deixa mais empolgado... conversando com a Doca, que é diretora da escolinha, percebi que posso ter uma grande liberdade de assuntos e métodos na aula, mesmo por que não há um programa de aulas seguido a risca, algo como o horário moçambicano... minha idéia é não fazer eles ficarem copiando aulas, ou decorando nome de continente ou coisa assim... vou conseguir um globo terrestre, fazer um sistema solar com alguma coisa que for adequada ainda não definida e mais algumas idéias que vão surgindo... Aqui irei passar apenas alguns meses, depois vou embora... portanto creio que não adianta tentar ensinar nada mais a fundo desejando que eles aprendam sobre colonização por exemplo... porém neste curto tempo talvez possa instigar que eles busquem mais para a frente saber mais sobre coisas que não fazem parte apenas do dia a dia... daquilo que eles vêem... da machamba (plantação) ou o que seja... que saibam que há lugares muito diferentes e que ao olhar para o céu eles não estão vendo muita coisa que lá está. Com as crianças, vou seguir com o projeto de geração de renda que o Fábio começou... há um forno, no qual os mais velhos fazem pães que são consumidos pelas crianças e futuramente a idéia é faze-los de folha de moringa (uma planta que possui uma quantidade de vitaminas que não imaginava existisse em apenas uma fonte) e vender os mesmos a comunidade, gerando alguma renda.

A Humana possui oficinas pedagógicas em escolas do governo por todo o país, nestas oficinas que possuem sempre algum computador, são dados cursos que ajudem as pessoas locais a gerar alguma renda e administrar esta renda gerada... Algumas oficinas estão na província de Manica (estado, onde está Chimoio) e vou viajar para estas oficinas dando cursos de 3 ou 4 dias sobre hardware de computadores... quando estive em uma das oficinas em Sussundenga, dos 4 computadores, 3 estavam com problemas de fácil resolução que poderiam ser liquidados caso alguém próximo tivesse algum conhecimento, portanto estas aulas tem como objetivo também deixar uma pessoa como responsável por estas pequenas manutenções em todas as oficinas que for.

Com certeza vou me frustrar com várias coisas pela frente, sei muito bem que partindo do ponto em que eu defino com o Bobby o que vou fazer, até o ponto em que tudo seja realmente feito há muito tempo... e o horário é moçambicano, porém tentemos não é.

Espero também que o sr Anopheles leve seus plasmodium para bem longe, por que as pessoas tem malária aqui na frequência de gripe e a cada malária uma grande quantidade de energia tem que ser recuperada e um bom tempo é perdido.

Aquele abraço

P.S – Mais algumas fotos







Wednesday, August 26, 2009

Boas e más

Ola,

Ontem fui a Sussundanga com o Rodrigo para conhecer uma oficina pedagógica e algumas escolas da região... escolas de barro, com 3 ou 4 alunos por carteira e uma merenda que se resumia a massa de milho... a mesma cena que tenho visto sempre por aqui, crianças magras, escolas miseráveis, merenda de massa de alguma coisa, nada de água, cozinha a céu aberto, ensino deplorável. Teoricamente ao chegar lá teríamos um homem da Humana que nos acompanharia para alguns lugares nesta fase de ambientação que estamos passando, porém como a grande maioria das coisas que a humana planeja, não havia planejamento algum, ficamos relativamente inúteis por um bom tempo.

Ainda durante a manhã houve a encenação de uma peça que os alunos estavam ensaiando a um bom tempo em uma oficina pedagógica, o tema, crianças órfãs que não tinham como ir a uma escola e mudar um pouco sua realidade... foi muito boa dadas todas as limitações que são passíveis de imaginação... a peça teve que ser interrompida pela metade pois começaram muito tarde e as crianças deveriam voltar as aulas da manhã, como sempre muuuuuito planejado e estruturado, pude sentir a frustração, estava legal mesmo, muitas, mas muitas crianças assistindo... tudo bem.

Após isso eu e Rodrigo fomos a biblioteca para conhecer um pouco do que eles lêem e tentar passar um tempo... o Rodrigo achou um livro que o título era algo do tipo ‘a culpa é desta tal liberdade’... eu peguei um de história que tinha mais erros e tendências do que jamais vi... porra deixa os livros... na mesma biblioteca chega um rapaz de um programa do governo chamado geração biz... que busca treinar pessoas das comunidades para atuarem como ativistas informando a comunidade sobre as epidemias e prevenção de doenças... meu Deus, o entrevistador estava passando por apuros... as pessoas que chegavam se candidatando (voluntariamente) á função, mal sabiam falar direito... ele tinha que recrutar 35, pelo que vi passou por grandes dificuldades...

Mais a tarde fui encontrando algo para fazer... na oficina pedagógica 4 computadores proviam toda a informática existente num raio de não sei quantos kilometros... dos 4, 1 não funcionava e 2 tinham sérios problemas de comportamento... deixei eles funcionando e me senti um pouco útil... passando o tempo, o professor que encenou a peça das crianças me perguntou se seria possível que eles encenassem novamente para que eu filmasse e eles enviassem a mesma a não sei qual companhia de Maputo, tentando expandir um pouco o horizonte, disse: claro! Aí eles encenaram a peça inteira e a filmagem ficou boa... também tirei bastante fotos e espero que eles tenham algum êxito... pelo menos pude fazer algo até o final do dia...

Hoje pela manhã acordei estranho... ontem o Fabio, meu companheiro de quarto foi ao médico pois estava sem voz, com dores de cabeça, tosse... resultado: Malária.... hoje minha vez... dor de cabeça forte, tosse, coriza, cansaço... na verdade parecia que algo andava dentro de mim... e andava mesmo... o tal do Plasmodium adentrou a meu ser (olha que romântico) em alguma destas noites que se passou...

O fato de que vários de meus companheiros por aqui tenham me dito que o tal remédio para a malária é um placebo, não fez com que eu não utilizasse o mesmo, estava tomando ele certinho, como não costumo fazer com remédios... mas, esta merda é um placebo mesmo e não serve para nada, portanto hoje joguei todos fora... vale a dica para meus amigos voluntários que logo estarão aqui... nem pega o remédio por que só tem efeito colateral (o Rodrigo passou malzasso) ocupa lugar na mala e não serve para nada... talvez para que se justifique mais alguma despesa no IICD. Enfim...

Fui a clínica aqui perto e pedi para que fizessem o teste da malária... pedi para que fosse feito aquele que tira o sangue da veia mesmo, por que funciona melhor e tal... o que fura o dedo apenas as vezes da negativo, mas a verdade é positivo... melhor clínica da cidade... vou reproduzir meu diálogo com a enfermeira...

T – Olá, pode fazer o teste com a seringa por favor
E – Por que ?
T – Porque aquele do dedo as vezes não funciona...
E – Mas o sangue não é o mesmo?
T – Sim, mas sei de pessoas que fizeram com o dedo e deu negativo... fizeram com a seringa e deu positivo...
E – Ok, mas o problema é que as seringas acabaram de manhã (!!!) mas eu tenho uma aqui que não sei se foi usada (aberta)
T – *¨&%## você tá maluca!!!!!!!!!! Seringa usada...!!!!! põe a luva e tira do meu dedo mesmo....

E fiquei perseguindo ela para me certificar que pelo menos o do dedo seria novo....

É isso aí... tiro a preocupação daqueles que porventura venham a se preocupar, pois a malária deve ser tratada com seriedade e é assim que estou tratando... descobri logo no começo o que tira muitos riscos da doença... usualmente as pessoas por aqui morrem ou ficam com sequelas por causa da doença por que não tem acesso a médico e só vão procurar alguma ajuda de verdade quando a doença já avançou bastante... bastante mesmo... fico alguns dias por aqui de molho, o que atrasa um pouco meus planos mas tudo bem... agora cuido da minha saúde, pois não esqueço de mim mesmo... com a medicação que estou tomando daqui a uma semana este parasita já não deve mais dormir comigo...

Finalmente coloco algumas fotos.

Aquele abraço