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Meu nome é Thiago Caro e em Novembro de 2008 decretei uma moratória a mim mesmo.
Morei um tempo bom em Michigan e viajei boa parte dos EUA em treinamento para o trabalho voluntário relacionado a educação que agora faço em Moçambique. Em Fevereiro de 2010 irei de Moçambique a Israel em uma viajem cruzando por terra, em transporte local, Tanzania, Kenya, Ethiopia, Sudão e Egito. Escrevo este blog como maneira de compartilhar minhas experiências e bobagens com todo aquele que ache interessante e fale português.

thiago_caro@hotmail.com

Sunday, October 18, 2009

Capacitação e cansaço

Ola,

Após grande pausa, uma volta ao blog...

Me sinto um pouco cansado. Trabalhar aqui trazendo a cultura ocidental e tudo mais que a acompanha é um esforço que corre junto a frustração o tempo todo. Muitas vezes me pergunto, será que é realmente necessário? Será que as coisas que tenho a oferecer quanto a tudo, sobre a cultura a qual venho, são realmente necessárias por aqui?

Ao ver alguém dito branco, as pessoas sempre vem com aquilo que precisam de uma forma ou de outra... ‘estou a pedir uma ajuda para fazer este trabalho’ ou ‘estou a pedir uma ajuda para mandar um email’ ou ‘estou a pedir esta sandália’ ou frequentemente ‘estou a pedir mili (um metical)’ ... Isso faz com que sempre que se esteja fazendo alguma coisa, haja uma grande probabilidade de ser interrompido,o que não seria problema caso houvesse um real interesse...

Quando alguém me pede para arrumar um computador que está com um problema ‘x’ qualquer eu sempre tento ensinar a pessoa como fazer... porém após 10 segundos de explicação a pessoa já está dormindo... a falta de vontade e de concentração aliadas ao fato que eu posso fazer o trabalho, levam a um estágio amorfo em que as pessoas criam uma certa angústia em você :
_entendeu?
_entendi... sim, claro!
_o que eu disse?
_oi, tava a falar comigo?

E sempre assim, acredite...

Portanto, percebe-se que não há um real interesse nas pessoas em aprender sobre alguma coisa que não faça parte da cultura daqui e tenho que confessar que as atividades aqui não são muito variadas... machamba (agricultura), música, dança e esportes... o resto é muito complicado e com rarissimas exceções as pessoas se deslumbram por alguns segundos, até o momento em que se desinteressam e a atenção fica dispersa...

Como já disse algumas vezes, ocidentalizar um lugar como Moçambique é um crime, eles possuem uma identidade muito forte como povo e tradições que remetem ao surgimento do homem... porém estas tradições tão milenares trazem danças maravilhosas, músicas maravilhosas, mas não traz água encanada, não traz esgoto e não traz alimento em um nível mínimo para todos. Para que as pessoas por aqui cheguem a esse nível mínimo de conforto (já que eles sabem que vivem muito mal em meio a todas essas necessidades) com certeza a fórmula mágica não virá de um branco ocidental que chegue aqui com a melhor das intenções... nós aqui somos sugados em toda nossa energia e o resultado final é que por enquanto estamos aqui, as coisas que trazemos funcionam, viramos as costas e acabou... como ninguem se interessou em aprender e nós estavamos aqui para fazer, basta ir embora e acabou.


Durante estes muitos dias em que não escrevi nada, um projeto que foi deixado por outro DI em minha mão levou muito de minha energia...Fabio conseguiu verba para a construção de um forno na escolinha em que dou aulas (formigas do futuro) e não teve tempo de começar a organizar como seria a produção, venda e tudo mais... fiquei com esta responsabilidade e a frustração vai correndo junto ao sucesso como sempre... o pão da escolinha deve ser vendido a EPF (escola que forma professores para as escolinhas) porém os próprios alunos, professores ano que vem, foram o maior empecilho inicial. Nos primeiros dias, por fofocas e conversas sem sentido (como já disse, aquela fascinação absoluta pela vida do outro) os professores resolveram não gostar do pão... então se ‘rebelaram’ contra o novo pão e chegaram até mesmo a atirar o pão no chão... Agora a padaria está funcionando e depois de muita discussão, a EPF está comprando os pães como combinado... ainda vou falar melhor deste projeto quando tiver confiança que ele deu certo, acredito eu ... ou errado.

Semana passada tive o curso de Hardware aos gestores de oficinas pedagógicas de Manica... foram 18 alunos, 5 dias e 10 horas por dia que realmente foram cansativas ao final... muito conteúdo, muito conteúdo novo e infelizmente pouca base para avançar bastante no assunto. Os gestores são pessoas mais bem informadas com certeza, porém a maioria nunca tinha pensado em como um computador funciona fisicamente e começamos bem do início mesmo. Foi muito boa a capacitação na verdade.

Durante as aulas percebi que alguns deles realmente tem potencial e podem tornar-se técnicos mais para a frente, caso continuem a se interessar... Prestavam muita atençao, faziam muitas perguntas e ao final conseguiram montar o computador sozinhos e uma pequena rede também. Outros alunos se interessaram muito, queriam realmente aprender, mas por falta de base a ‘coisa’ não adentrou a suas mentes... já outros alunos, com os quais parei de me preocupar no primeiro dia não queriam saber de nada além de dormir ou fazer barulho...

Ao final fizemos uma prova, teorica e prática. Como eles receberam certificados da ADPP não facilitei muito a vida e ao final 5 não puderam receber o certificado por não alcançarem o mínimo na prova... combinamos que eles iriam estudar as apostilas que distribuí, e em breve iremos fazer uma segunda prova. O resultado foi melhor do que o esperado, ao final pessoalmente percebi que minha imensa paciencia é na verdade um pouco maior do que eu pensava... ainda pessoalmente fiquei satisfeito também por ter aguentado a carga horária frenética sem nenhum desmaio. Para todo o grupo, creio que aqueles que queriam aprender alguma coisa aprenderam... em níveis diferente mas aprenderam, tanto é que por coincidência ou não, os 5 que não receberam os certificados foram os mesmos que se interessaram em recuperar o sono atrasado.

Amanhã, segunda feira, viajo para Dombe ao sul de Manica para um encontro com os mesmos gestores a fim de adequarmos algumas coisas nos projetos de geração de rendimento das oficinas (jeito moçambicano de dizer) e para uma breve capacitação em Excel... lá ficarei até quinta feira, quando vou para Vilancullos, a praia que dizem ser o lugar mais lindo de Moçambique, num arquipélogo de ilhas de areia, com golfinhos, baleias e um gigantesco coral de recifes... a final, sou um ser bem humano e mereço meu descanso....

Um grande abraço e até a próxima.




P.S - Algumas fotos da capacitação, logicamente não tiradas por mim visto que apareço nas mesmas!


2 Comments:

pais said...

De longe conseguimos medir o tamanho do seu esforço.Voce quando se dedica a algo vai até o limite.Esse limite só voce pode saber! Sempre te apoiaremos.Um beijão de seus pais pra voce que é com certeza um ser bem humano. Boa viagem e fique com Deus

Ruth said...

Ensinar a gostar de aprender é realmente, o mais difícil em uma relação onde tem alguém querendo passar conhecimento, pra outro alguém que nem sabemos se quer mesmo aquele conhecimento.
Tenho visto todos os seus comentários e, de forma bem diferente, sei como é a frustação de tentar ajudar e o outro simplesmente não querer, ou querer sem mudar. Daí não dá, né!
Por enquanto, o que tenho conseguido, é provar que mudar é bom, mostrar os benefícios de aprender algo. Ou mesmo as vantagens.
Admiro a paciência. Não vou falar que admiro a persistência pq essa eu sempre soube que vc tem, aliada à teimosia, que vejo que pode ser boa de vez em quando... rs
beijo, eu